quinta-feira, 22 de setembro de 2022

A lenda do salteador de Capelins

 A lenda do salteador de Capelins 

Como sabemos, apesar da justiça ter mão pesada, existiam muitos salteadores por todo o reino de Portugal ao longo dos tempos e, também as terras de Capelins tiveram o seu notável salteador nas últimas décadas de 1700. A criatura apareceu sem ninguém saber de onde, vivia escondido pelos matos em várias choças e assaltava os transeuntes mais descuidados e que viajavam sozinhos. Assustava mais do que roubava, porque pouco havia para roubar, a sua figura física deixava qualquer um a tremer de medo, era alto e bem encorpado e tinha um golpe de faca na face direita, que por não ter sido tratado deixava descair a face realçando o olho direito. Nos seus assaltos saltava sempre em frente do alvo munido de uma faca das "matanças" e gritando: "a bolsa ou a vida", poucos assaltados tinham bolsa e nunca tirou a vida a ninguém, levava alguma coisa para comer e pouco mais, mas isso ficava mal às gentes das terras de Capelins, que o apelidaram de Zé da faca. Um dia, como habitualmente, o Pároco Laurentino da Paróquia de Santo António, foi rezar a missa à Ermida de Nossa Senhora das Neves, porque ainda lá havia uma grande comunidade e devido a vários condicionalismos, convidaram-no para cear (jantar) que ele não podia recusar e voltou já à noitinha. Quando seguia pelo caminho do vale de enxofre acima, na Defesa de Ferreira, saltou-lhe o Zé da faca ao caminho gritando: "a bolsa ou a vida", o Pároco teve vontade de rir, mas ao ver a faca virada para ele, ficou sério e depois respondeu: Bolsa não tenho, mas a vida é tua, posso é dar-te a batina e o crucifixo que tenho ao peito! O Zé da faca ficou muito pensativo sem saber o que dizer, depois exclamou: Não quero nada disso, para que me serve? Ainda nunca me aconteceu uma coisas destas, que triste vida a minha e outras lamurias! Continuava com a faca apontada ao Pároco Laurentino, mas ele colocou-lhe a mão no ombro e pediu-lhe para se sentar. Sentaram-se os dois no chão a falar, ninguém soube o que o Pároco lhe disse, mas sabe-se que o Zé da faca arrependeu-se do que fazia, chorou e pediu a penitência ao Pároco, que lhe a concedeu, comprometendo-se ele, a partir daquele dia ficar pelas terras de Capelins, mas em vez de fazer o que fazia, começava a proteger e ajudar as pessoas que cruzavam aqueles caminhos e o Pároco ajudava-o. O Zé da faca aceitou logo e começou imediatamente a cumprir o que tinha prometido ao Pároco Laurentino! 

O Pároco, nas missas, informava os fregueses sobre a mudança que se tinha dado com o Zé da faca, mas poucas pessoas acreditavam, e assim ao inicio de uma noite de inverno o Ti Manoel Gomes regressava a sua casa em Capelins de Cima com a carroça carregada de lenha da Defesa de Ferreira, e deu-se um pequeno acidente, teve de descarregar a lenha, para meter a carroça no caminho, o Zé da faca andava por perto e ao ouvir a azáfama aproximou-se para ajudar, mas o Ti Manoel pensou que ele o ia assaltar, apanhou o machado e desferiu-lhe um golpe que lhe rachou a cabeça de alto a baixo, ficando o Zé da faca logo morto. O Pároco Laurentino soube do acontecimento e tendo a certeza que ele apenas queria ajudar o Ti Manoel Gomes, fez-lhe um funeral com todos os Sacramentos, como um bom cristão! 
O Ti Manoel não foi preso, porque supostamente, agiu em legitima defesa, ficou muito arrependido, mas não havia nada a fazer!
Muitos capelinenses diziam que, o Zé da faca morreu por querer ser bom! Mas foi um engano! 

Fim 

Texto: Correia Manuel

Ribeiro das Neves


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