quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A lenda do bácoro que ladrava como os cães

 A lenda do bácoro que ladrava como os cães 

Quando chegou o mês de Março do ano de 1895, o ti Domingos Lopes, seareiro, morador em Capelins de Baixo, disse à mulher a ti Maria Vicência que estava na hora de comprar o bácoro para o chiqueiro, por isso, ia dar uma volta por Santa Luzia, Aguilhão e Amadoreira, para ver o que por lá tinham e, de onde lhe agradasse daí o trazia! Na madrugada do dia seguinte, meteu a mula nos varais do carro (carroça) e, pôs-se a caminho, como a Ribeira de Lucefécit ainda levava muita água foi passar ao porto das Águas Frias de baixo, aí encontrou um desconhecido que, depois de alguma conversa e de saber o destino do ti Domingos, disse-lhe que andavam a vender bacorinhos num carro, (carroça) na Aldeia do Rosário e, eram muito bons e baratos! O ti Domingos já não foi para Santa Luzia, procurou o vendedor e depressa comprou o bácoro!  Pelas 11 horas já o tinha dentro do chiqueiro! A ti Maria foi a correr ver o novo bacorinho, ficou muito contente com a compra, deram-lhe uma travia de farinha de cevada com farelo e uma tigelinha de cevada, comeu tudo sem hesitar, dando sinais que era bom para a engorda!
A partir daquele dia, durante dois meses, decorria tudo normal com o bácoro, até que, uma noite o ti Domingos acordou com o ladrar de um cão, que não o deixava dormir, levantou-se e foi à porta zangar-se com ele, que parou um momento, mas logo continuou e o ti Domingos foi novamente à rua e, seguiu na direção de onde vinham os latidos chegando mesmo ao chiqueiro do bácoro, o qual, estava em pé, de olhos postos no ti Domingos e, momento antes tinha parado o latido, ele ralhou com um suposto cão mas, embora se visse como de dia, não viu nada, foi para casa e não demorou nada, voltou tudo ao mesmo, então, o ti Domingos foi pé ante pé até ao chiqueiro e ficou com a certeza que era o bácoro que ladrava! Voltou para casa e, contou à ti Maria! Ela não acreditou e disse-lhe que tinha apanhado sol na cabeça, no dia seguinte tirava-lhe o sol, com uma oração, um pano de linho e um copo de água fria! Como o ti Domingos não tinha maneira de provar o que tinha descoberto, deitou-se e, não falou mais no assunto! 
O bácoro do ti Domingos só ladrava nas noites de lua chia e não deixava dormir os donos nem os vizinhos, numa dessas noites o ti Domingos, obrigou a ti Maria a levantar-se, foram os dois muito devagarinho e apanharam o bácoro a ladrar no meio do chiqueiro! A ti Maria levou as mãos à cabeça e disse: "Ai valha-me Deus, isto é coisa de feiticeiras, amanhã temos de ir à bruxa de Terena e benzeu-se! Na manhã seguinte, levantaram-se cedo e foram tratar das galinhas e do bácoro, mas ele não estava no chiqueiro, ainda pensaram que o tinham roubado, mas lembraram-se que estava tudo ligado com o que tinha acontecido durante a noite, ainda o procuraram pelos ferragiais de Capelins de Baixo, mas só encontravam patadas de cão! A seguir foram à bruxa a Terena e contaram-lhe como tudo se tinha passado desde a compra do bácoro! A bruxa disse-lhe que nem o procurassem, porque nunca mais o iam encontrar, mas ele ia aparecer-lhe transformado em cão rafeiro alentejano numa noite de lua cheia e para não terem medo dele porque ele era muito submisso e muito meigo, e ensinou-lhe umas mesinhas para fazerem durante oito dias para afastar a feitiçaria da sua casa! A bruxa ainda adiantou: "conforme há pessoas, assim há animais"!
Um mês depois, numa noite de lua cheia, ouviram um cão a ladrar à porta, o ti Domingos deu um safanão na ti Maria, que quase a atirou da cama abaixo, mas ela também já estava acordada e disse-lhe: Vamos lá vê-lo? Eu não! Que medo! Disse a ti Maria! O cão não se calava e arranhava na porta, acabaram por ir ter com ele! Assim que os viu ficou muito contente a abanar a cauda a lamber-lhe as mãos, como a pedir-lhe desculpa, depois, deu meia volta e desapareceu pelo ferragial abaixo e nunca mais o viram nem ouviram! 
O ti Domingos Lopes, teve de ir a Santa Luzia comprar outro bacorinho para o chiqueiro, que engordou normalmente. 

Fim 

Texto: Correia Manuel


Chiqueiro em Capelins






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