segunda-feira, 3 de outubro de 2022

A lenda do Torra Migas de Capelins

 A lenda do Torra Migas de Capelins

Nas últimas décadas de mil e oitocentos, chegou às terras de Capelins uma Família originária da Freguesia de Corval, com passagem temporária pela vizinha Freguesia de Santiago Maior, onde nasceram três dos seus seis filhos! Como outras Famílias, também esta, se deu muito bem nas terras de Capelins, fixou-se em Montes Juntos e, aqui ficou, embora a sua descendência, naturalmente disseminou-se pelas terras de Capelins e arredores, os filhos foram casando e dando continuidade ao seu ramo familiar, assim como, a outros! Um dos descendentes desta Família, era o ti Manoel António da Rosa, morava em Montes Juntos, era casado com a ti Gertrudes Loureta e, pai de três filhos, trabalhava como jornaleiro no Monte da Talaveira, ia dormir a casa, mas tinha de sair de madrugadas para a herdade da Talaveira, quando lá chegava, antes de saírem para a lavoura, faziam umas migas na casa dos ganhões! Como não era possível cada um fazer as suas, combinaram que, diariamente cada um levava um pão e enquanto os outros emparelhavam as mulas e os bois, o que estava escalado fazia as migas para todos que, eram o seu almoço (pequeno almoço)! Os jornaleiros, andavam no alqueve, primeira lavoura do pousio e, nessa madrugada, calhou ao ti Manoel António a levar o pão e a fazer as migas, os outros trabalhadores estavam muito animados, porque, quando as migas eram feitas por ele, ficavam sempre muito boas, por isso, enquanto emparelhavam o gado da lavoura, iam comentando que era dia de boas migas! O ti Manoel António, colocou a tigela de fogo ao lume em cima da trempe de ferro, deitou duas colheres de banha de porco, foi mexendo para derreter e quando já estava bem quente deitou-lhe alguns bocadinhos de toucinho a fritar, depois tirou-os adicionou dois dentes de alho que foram fritando, sempre mexendo com uma colher de pau, quando os dentes de alho já estavam a ficar alourados, começou a pôr as fatias do pão, uma em cima de outras, sal e uma folha de louro, logo a seguir tirou um quartilho de água quente da panela de ferro e foi deitando por cima das fatias de pão, até ficarem cobertas! As fatias de pão estavam a amolecer, então com grande energia, usando a colher de pau, começou a triturar as fatias de pão, porém, talvez devido ao esforço instantâneo, deu-lhe tão grande dor de barriga que o ti Manoel quase fazia ali, tinha de correr para a casa de banho, no campo, mas as migas estavam num ponto que não as podia abandonar sobre o lume e ainda não estavam em condições de as arredar, tinham de ferver um pouco, então, lembrou-se de chamar alguém para tomar conta das migas, mas os jornaleiros andavam tão entusiasmados nas suas tarefas que não o ouviam, tirou alguns tições para enfraquecer o lume e correu para trás de um cabanão, mas a dor era tão forte que demorou muito mais tempo do que ele esperava! Quando se conseguiu desembaraçar da situação, foi a correr para a casa dos ganhões, mas já era tarde, cheirava a migas queimadas, porque, estava um madeiro na cabeceira do lume que tomou muita força e as migas desse lado e do fundo da tigela de fogo, já estavam queimadas! O ti Manoel da Rosa ficou numa grande aflição, sem saber o que fazer, não tinha pão, nem tempo, nem tigela de fogo para fazer outras migas e os trabalhadores estavam mesmo a chegar e, chegaram naquele momento, entraram fazendo grande alarido, mas deram um passo atrás e disseram: "Ai valha-me Deus, as nossas migas arderam"! Foram entrando e estava o ti Manoel com a cabeça entre as mãos, sem conseguir falar! Os homens, começaram a fazer perguntas todos ao mesmo tempo, queriam explicações sobre o que se tinha passado com as suas miguinhas! O ganhão, estava em frente ao Monte da Talaveira, mas ao ouvir tanta gritaria, correu para a casa dos ganhões, mas não foi preciso perguntar nada, o cheiro a migas torradas explicava tudo! O ganhão acalmou os homens e pediu ao ti Manoel para contar o que tinha acontecido! O ti Manoel contou tudo com muita calma e tristeza que, os homens compreenderam a situação, mas continuaram inquietos, porque, não tinham mais nada para comer! O ganhão contou-lhe que já tinha assistido várias vezes a casos iguais e as migas comeram-se bem, porque a parte queimada era só no fundo da tigela de fogo, então pediu ao ti Manoel para distribuir as migas pelos pratos sem afundar a colher, para não apanhar a parte queimada! O ti Manoel foi tirando as migas com muito cuidado e os homens começaram a comer, um pouco desconfiados, mas não demoraram em confirmar que, estavam boas, quase não sabiam a queimado! A parte queimada ficou agarrada ao fundo da tigela de fogo, mas alguns homens não resistiram em a raspar com a colher, começaram a comer e a dizer que sabia muito bem, era melhor que pão torrado, comeram todos, até ficar tudo limpo e o ti Manoel ficou muito aliviado! A seguir, foram para o trabalho e o tema da conversa do dia, foram as migas do ti Manoel! Alguns, por brincadeira começaram a chamar-lhe o ti Manoel Torra Migas, como ele achou graça, também por se sentir aliviado por a situação se ter resolvido, então, não nunca mais se livrou desse apelido, assim como, os seus filhos, entre eles, o ti António Torra Migas, o grande jogador de xito e, ainda há poucos anos, existia esse apelido, os "Torra Migas", nas terras de Capelins.
Fim

Texto: Correia Manuel



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