quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A lenda da mulher de vermelho, no Ribeiro do Carrão

 A lenda da mulher de vermelho, no Ribeiro do Carrão 

Conta-se que, no início do mês de Junho de 1915, o ti Miguel da Roza, que morava em Capelins de Baixo, teve que abastecer a casa de farinha, porque já não tinham para a próxima cozedura, mas como já andava a ceifar as favas e a cevada, não lhe dava jeito perder uma manhã para ir ao Moinho das Azenhas Del-Rei, então, pensou em ir á tardinha e dormir lá no rio Guadiana, levava um saco de cevada e um de trigo e, se não houvesse farinha feita, dava tempo para o moleiro a fazer durante a noite e de madrugada voltaria a casa, aproveitando o dia para continuar a ceifar e, foi assim que fez.
O moleiro, até tinha farinha para troca, mas mesmo assim, o ti Miguel ficou, porque era muito bom dormir naquele lugar mágico. 
De madrugada, carregou a farinha e seguiu pelo caminho que passava junto à fonte da lesma, deu água à mula, encheu o barril de água fresca e não se demorou.
Quando o ti Muguel estava passando o Ribeiro do Carrão, já se começava a ver bem e reparou num vulto à sua frente, mais próximo viu que era uma mulher com um vestido vermelho, uma coisa nunca vista por ali.
O ti Miguel pensou que devia ser alguma espanhola, ela virou-se e tinha a cara tapada com o lenço da cabeça, deixando-lhe os cabelos compridos à solta, a mulher levantou o braço direito fazendo sinal para ele parar o carro (carroça).
Aí, oh! Disse o ti Miguel e, a mula parou imediatamente.    
Mulher: Bom dia! 
Ti Miguel: Bom dia! 
Mulher: Então não me leva a cavalo até lá acima? 
Ti Miguel: Não levo! Eu não vou lá para cima, vou para Capelins de Baixo! 
Mulher: Está bem, leve-me até perto de Capelins de Baixo!
Ti Miguel: Então suba depressa aí pela rabicha, que eu não tenho vagar nenhum, estou com muita pressa! 
A mulher para chegar à rabicha do carro (carroça) levantou o vestido vermelho até quase aos joelhos, mostrando um palmo das canelas, o bastante para o ti Miguel começar a gritar para ela se afastar, porque já não a levava a cavalo.
Mulher: Tão agora, o que é que eu fiz? Não me disse para subir pela rabicha? 
Ti Miguel: Oh mulher, ainda pergunta o que fez? Vomecê não viu que faltou pouco para me mostrar as pernas todas? Quase que lhe vi os joelhos! Então se alguém visse uma coisa destas, uma mulher a saltar-me para o carro e quase de joelhos à mostra, o que eu arranjava com a minha Maria e o que diriam por aí! Eu sou uma pessoa muito honrada! Não admito falta de respeito! Olhe vá a pé, comigo é que não vai! 
O ti Miguel não esperou mais explicações e, deu ordem à mula para andar, não olhando mais para a mulher e seguiu pela estrada mesmo ao lado do Ribeiro do Carrão, pela Zorra, alto do malhão, Ribeiro da aldeia, Monte do marco e chegou a Capelins de Baixo.
Assim que descarregou a farinha na casa do forno, foi contar à mulher o que tinha acontecido, mas ela não acreditou em nada, no entanto, com receio da reação dele, não o contrariou, apenas comentou:
- Com um vestido desses, de cerimónia, devia vir de alguma festa e andava perdida ou era espanhola! 
Ti Miguel: Nem uma coisa nem outra, mulher, ela falava bem o português e por ali não há festas! É um mistério que anda por aí!  
A ti Maria ainda pensou: Decerto, que vinha a dormir e a sonhar com uma mulher de vestido vermelho, mas não se atreveu a dizer mais nada. 
O ti Miguel continuou a contar a toda a gente o acontecimento daquela madrugada e, além de quase ninguém acreditar nele, foram vistos alguns rapazes das terras de Capelins pelo Ribeiro do Carrão, nas madrugadas seguintes, na esperança de ver a mulher do vestido vermelho que, tinha aparecido ao ti Miguel da Roza, mas nunca mais houve sinais dela. 
A intriga dos capelinenses era: "O que andaria a mulher a fazer, de madrugada, de vestido vermelho, no Ribeiro do Carrão"?  E, alguns afirmavam que, só podia ser uma feiticeira que se atrasou na volta do baile.  

Fim 

Texto: Correia Manuel

Roncão de Capelins




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