segunda-feira, 26 de setembro de 2022

A queima dos bonecos de Palha

 A queima dos bonecos de Palha em Capelins

A queima do boneco, simbolizava a "queima do Judas" e, tal como a "serração da velha" também era uma tradição pagã, que se realizava na Quaresma, em algumas localidades no sábado de Aleluia, noutras nessa mesma semana, ambas estavam ligadas à "queima do Judas".
Em Capelins, o boneco que queimavam representava alguém que se procurava atingir, com a finalidade de vingança, fazendo uma crítica a um rapaz que estava mal visto perante as raparigas da Aldeia por ter "feito pouco de alguma", isto é, ter namorado com ela e depois tê-la deixado, sendo uma grande ofensa para ela e para toda a sua família, porque, depois já nenhum rapaz da sua aldeia queria casar com ela, ficava "desgraçada", se não viesse algum rapaz de fora, de outra localidade, a procurá-la, já seria muito difícil de casar, a não ser com um rapaz que por algum motivo tinha dificuldade em encontrar rapariga para se casar, ou um viúvo.
Também acontecia, uma rapariga ser dada a um rapaz, ou seja, por brincadeira, ou não, um rapaz recebia uma proposta de uma pessoa mais velha, às vezes da família dela, para se arranjar (namorar) com uma determinada rapariga, essa pessoa dizia "que seria boa para ele" e, se o rapaz respondesse mal, que não gostava dela porque era feia, ou mal jeitosa ou outro defeito, depois se essa resposta chegasse aos ouvidos das raparigas em causa, elas podiam ignorar ou ficar ofendidas e, geralmente elas exclamavam: "Quem é que ele pensa que é? "Um feioso daqueles", ou coisas semelhantes e, juravam vingança, ou seja, depois queimavam o Judas, que era esse rapaz e, ao mesmo tempo, tentavam denegrir a a sua imagem, na brincadeira.
A rapariga, da qual um rapaz "fazia pouco", no ano seguinte, tinha a oportunidade de, através da queima do boneco o difamar e, simbolicamente o queimar, era tudo preparado em segredo, com um grupo de raparigas com boas relações entre elas, e que também se sentiam ofendidas.
As raparigas construíam o boneco secretamente, feito de palha e papéis, e vestiam-no com roupa velha para ficar o mais parecido possível com o rapaz que queriam atingir, era espetado num pau com dois ou três metros e no dia específico juntavam-se todas, puxavam fogo ao boneco, gritavam palavras, geralmente em verso, contra aquele rapaz que o boneco representava e entoavam cânticos através dos quais o ridicularizavam, diziam: "que tinha o nariz torto, que tinha as pernas tortas, que era muito feio e evidenciavam outros atributos ofensivos. 
Em alguns anos, a data da queima do boneco era na época da monda do trigo, elas levavam o boneco de madrugada e escondiam-no no caminho para o trabalho e à noitinha, quando voltavam, antes de entrarem na Aldeia, puxavam-lhe fogo e davam início ao espetáculo. 
As pessoas iam assistir para saber quem eram os rapazes que os bonecos representavam e o que diziam deles, porque depois, era tema de conversa durante muito tempo nas Aldeias. 
Após o boneco arder, acompanhado de cânticos e de gritos estridentes, ficava o assunto resolvido com o respetivo rapaz e a vida continuava, mas algumas raparigas, nunca mais na sua vida, falavam com os respetivos rapazes nem com a sua família. 

Fim 

Texto: Correia Manuel

Antiga Vila de Ferreira 


 

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