sábado, 26 de agosto de 2023

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando bebeu o aniz a caminho de Montejuntos

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando bebeu o aniz a caminho de Montejuntos 

No decénio de 1960, os bailes de Natal na Aldeia de Ferreira, eram realizados na noite de Natal 24 de Dezembro, nos dois casões dos bailes que, ficavam apinhados de gente, começavam pelas 22 horas e não tinham hora marcada para acabar, podia ser às três ou quatro horas da madrugada, dependia da disposição das mães das raparigas, porque, quando as últimas davam a ordem de recolha a casa, acabava-se o baile. 

Quando os bailes acabavam, as mães e filhas iam para casa, mas alguns homens e rapazes, formavam grupos e mesadas para petiscar frangos assados, porque de madrugada a fome já apertava, mas assim que acabavam os petiscos a taberna fechava e a rapaziada arranjavam umas feixas de lenha e iam para o início da rua principal de Capelins de Baixo, faziam um lume, porque estava sempre muito frio e continuavam a falar, a cantar e a beber algumas bebidas, das quais se tinham prevenido e, aí continuavam até que abrisse a primeira taberna para darem continuidade à Festa de Natal. 

Numa madrugada de Natal, dos finais de 1960, depois do baile acabar e da taberna fechar, um grupo de rapazes, do qual fazia parte o Chiquinho de Capelins, levaram umas feixas de lenha e fizeram um lume no dito lugar, quase em frente às escadinha do Pinheiro, começaram a cantar e a falar e iam bebendo uns tragos de licor de aniz escarchado de uma garrafa que tinha calhado ao Chiquinho numa rifa durante o baile e, com o calor do lume alguns rapazes começaram a bocejar e a dizer que estavam cheios de sono, e que estavam a pensar em ir à procura da cama, e o Chiquinho disse-lhe que não era boa ideia, porque, assim passavam o dia de Natal metidos na cama, era um desperdício e propôs-lhe irem a Montejuntos a pé, e como lá o café abria cedo, ou nem fechava, bebiam uns cafés com aguardente ou licor e quando voltassem à Aldeia de Ferreira já alguma taberna estava aberta e continuavam a festejar o Natal e todos concordaram com a proposta. 

Pelas seis horas da manhã, em pleno inverno, ainda estava escuro e muito frio e a rapaziada partiram para Montejuntos com um resto de aniz na garrafa que se acabou antes de chegarem ao Ribeiro do quebra e, quando iam à curva, devido ao frio, todos pediam uma pinguinha de aniz, e o Chiquinho respondeu que, já não havia, mas em Montejuntos compravam meio litro de aguardente para juntar ao aniz cristalizado, depois de bem batida ficava muito bom, mas ainda estavam muito longe de Montejuntos e, alguns lembraram-se que em vez da aguardente podiam meter água na garrafa, depois batiam-na e dava uma pinga para cada um, mas ali, só havia água da chuva e lembraram-se que podiam encher a garrafa num regatinho, nesse tempo toda a gente bebia neles e, a água era muito boa e o Chiquinho saiu da estrada e entrou na herdade do Seixo à procura de um regato, mas ainda havia pouca luz e ele assim que viu uma poça de água não procurou mais e começou a encher a garrafa, mas naquele lugar pastava o rebanho de ovelhas do ti Xico e, por azar, a água estava cheia de caganitas das ovelhas, algumas moles e grandes que, depois de mexidas com os movimentos da garrafa desfizeram-se e deixaram a água amarelada, quando o Chiquinho se apercebeu já era tarde, já estava a garrafa mais de meia, ainda pensou em a deitar fora, mas como os rapazes já se estavam a lamber e a dar pressa, não o perdoavam, bateu bem a água dentro da garrafa, levou-a ao nariz e cheirava bem a aniz, então, passou-a para todos beberem uma pinguinha e, à medida que iam bebendo todos diziam que estava muito bom, uma delícia, alguns ainda disseram que estava muito amarelo, muito turvo, e o Chiquinho apressou-se a dizer que era dos cristais de açúcar amarelo e do ramo da flor do aniz natural que era castanha e que depois de bater a água na garrafa tinha ficado turva e, bebeu a sua parte, mas não divulgou a causa do aniz escarchado ter ficado amarelado e tão saboroso. 

Com o licor de aniz escarchado com sabor a caganitas de ovelha, a rapaziada ganhou ânimo e, rapidamente chegaram a Montejuntos, beberam uns cafés, licores e aguardente e voltaram para a Aldeia de Ferreira e, como já estava uma taberna aberta continuaram a festejar o dia de Natal. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 

Aniz Escarchado de Évora 




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