sábado, 14 de janeiro de 2023

O livrete e a licença de trânsito das carroças de Capelins

 O livrete e a licença de trânsito das carroças de Capelins

A Vila de Ferreira, atual Freguesia de Capelins, era uma Defesa com donatário, entre 1314 e 1698, porém, nesta data foi repartida em herdades de menores dimensões, sendo duas doadas à Casa do Infantando e as restantes vendidas a lavradores da região, assim como, algumas courelas a sul da atual Aldeia de Ferreira e outras foram aforadas pela Câmara de Terena onde, atualmente se situa a Aldeia de Montejuntos.
A venda e aforamento das ditas courelas, permitiu a instalação de alguns seareiros, vindos a maioria, das localidades vizinhas, como Monsaraz, Santiago Maior e Terena.
Os seareiros eram assim designados, porque cultivavam pequenas courelas deles próprios e outras que lhe eram cedidas pelos lavradores, aos quais, pagavam com parte das colheitas, ou seja, com uma terça ou quarta, ou quinta parte das mesmas, sendo uma agricultura de subsistência, para governar a sua casa e vender o excesso se os houvesse, para os celeiros do Reino.
Nas centúrias de 1800 e 1900, através dos Registos Paroquiais de Santo António de Capelins, verificamos que nas terras de Capelins o número de seareiros é sempre crescente, eram raras as famílias que não eram seareiros, porque com a venda dos Baldios de Capelins e de parte das herdades da Defesa de Ferreira, Monte da Vinha, Roncão, Carrão e de outras, em courelas, permitiram a instalação de imensos seareiros na Freguesia de Capelins.
Para além de os seareiros serem proprietários, ou não, de algumas courelas, para ser serareiro tinham de ter pelo menos uma muar, uma carroça, um arado ou charrua, uma grade para alisar a terra depois de lavrada e os respetivos apetrechos inerentes, sendo necessário, algum investimento inicial, mas com ajudas familiares e empréstimos, lá começavam a ser seareiros, sendo o objetivo de muitos capelinenses, não só para se tornarem independentes dos patrões lavradores, também por tratarem do que era seu, terras e arvoredo.
Noutros tempos, ninguém podia montar uma muar, porque era um animal de trabalho, sem ter uma licença, ficando sujeito a pesadas coimas, mas como surgiram os carros de tração animal, esse problema ficou resolvido, as pessoas seguiam em cima das carroças, não precisavam de montar nas muares, logo essas licenças caíram em desuso, porém, os cobradores de impostos alertaram para a situação e foi deliberado que os veiculos de tração animal tinham de ter livrete e uma licença para circular nas boas estradas que existiam, quase sempre arranjadas pelos seareiros para poderem transitar e assim surgiu o livrete e a licença de trânsito das carroças, as quais, na Freguesia de Capelins eram algumas centenas.
Assim, os veículos de tração animal (carroças), tinham um livrete como têm hoje os automóveis e uma chapa de matrícula afixada na mesma, cujo número coincidia com o do livrete, este emitido pela Câmara Municipal do Concelho onde a carroça circulava e a licença pela Secção de Finanças.
No livrete da matrícula do veiculo de tração animal constava, além do número, a data da sua emissão, o nome do proprietário, a filiação, naturalidade, residência, a indicação que era um veiculo de duas rodas, tirado por um, dois, ou mais animais da espécie muar e destinava-se a transporte de Pessoas e Mercadorias em serviço Particular, assim como, as obrigações a que o proprietário ficava sujeito, que eram as seguintes:
- O proprietário deste veiculo fica obrigado a participar à Câmara Municipal, dentro do prazo de 3o dias, desde a data em que tais factos ocorram:
1 - A transferência de proprietário do veículo;
2 - A mudança de residência do proprietário;
3 - A transferência a título permanente do veiculo para outro Concelho;
4 - A inutilização definitiva do veículo.
O presente livrete deve acompanhar sempre o veículo quando transitar na via pública.
O livrete será apreendido nos seguintes casos:
a) Quando se encontrar em mau estado de conservação ou se verifique que sofreu violação de qualquer ordem;
b) Quando as características do veiculo a que respeita não confiram inteiramente com as nele mencionadas;
c) Quando se verifique que o veiculo mudou de proprietário e continua registado em nome do anterior;
d) Quando se verifique que o veículo não oferece as necessárias condições de segurança;
e) Quando o veículo for apreendido.
O livrete poderá ainda ser apreendido em todos os outros casos em que o veículo não tenha a sua situação legalizada nos termos do Código da Estrada.
Mediante este livrete era emitida uma licença de trânsito da respetiva carroça, pela Secção de Finanças do Alandroal, válida entre Janeiro e Dezembro de cada ano e onde constava o nome do proprietário, residência, veiculo de duas rodas e estava explícito se era tirado por um ou dois animais, que possui neste Concelho, para transitar nas estradas a cargo do Estado, a sua data de validade que seria 31 de Dezembro do ano da emissão.
Assim, as carroças ou carros de atração animal eram fiscalizados pela Guarda Nacional Republicana, neste caso, da Vila de Terena que, geralmente detetavam sempre, alguma infração, muitas vezes eram os familiares ou outras gentes que corriam ao encontro dos seareiros, antes da chegada à operação STOP para, eventualmente evitar uma coima, quando não tinham dinheiro para nada, mas eram estas as regras.
Fim
Texto: Correia Manuel




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