domingo, 5 de novembro de 2023

História da vida de Manel Fernandes, de Capelins

 História da vida de Manel Fernandes, de Capelins 

Manel Fernandes, nasceu no ano de 1607, era filho de povoadores de Capelins, onde chegou ainda criança, aqui cresceu e começou muito cedo a aprender a profissão de ferrador de cavalos e de muares de trabalho, mas nessa época, um ferrador tinha conhecimentos de veterinária e tratava todos os males desses animais. 

O Manel Fernandes era apaixonado pela sua profissão e afamado por toda a região, sendo chamado muitas vezes para ferrar e tratar cavalos da fidalguia da Casa de Bragança, os quais, mais tarde lhe valeram. 

Quando chegou à idade casadoira, cerca do ano de 1632, encontrou a rapariga que o levou ao altar na Igreja de Santo António, chamada Maria Rita, e pouco depois, começaram a surgir os filhos, porém, já quase com trinta anos, o Manel Fernandes foi trabalhar para a Vila de Cheles, logo ali no outro lado do rio Guadiana, por isso, não levou a família, estava perto de casa, onde voltava quase todas as semanas, desde que as cheias do dito rio o permitissem, trazia algum dinheiro e visitava os pais, a mulher e os filhos, porque não existia qualquer fronteira, uma vez que, o Reino de Portugal estava sob o domínio de Castela. 

Devido à sua simpatia, aos seus feitos e dedicação à sua profissão, que era muito importante, o Manel Fernandes, depressa ganhou a admiração dos cheleiros, assim como, de pelo menos uma cheleira chamada Maria Pires, pela qual se perdeu de amores, mas ela não lhe permitiu avanços sem casamento e o Manel nem pensou na família que já tinha e onde se estava a meter, pensou que, podia  ter duas casas, duas famílias, uma além e outra aquém Guadiana, sem ninguém dar por isso, e casou com a Maria Pires. 

Durante algum tempo, foi conseguindo dar assistência ás duas mulheres, quando faltava aos compromissos com a Maria Rita, dizia-lhe que o trabalho em Cheles era muito, ou que a cheia do rio Guadiana não o tinha deixado passar e passava cada vez mais tempo sem aparecer a Capelins, e à Maria Pires de Cheles, dizia-lhe que tinha de ir ver os pais e a família a Capelins, mas a Maria Rita começou a desconfiar que não era bem assim, e um dia mandou os irmãos a Cheles averiguar a vida que o Manel por lá fazia e não foi preciso procurar muito para saberem que ele tinha lá casa posta e mulher e que era casado com ela, eles não queriam acreditar, mas perante as evidências, ficou tudo esclarecido. 

Esta descoberta foi um escândalo, que depressa se espalhou pelas terras de Capelins e num ápice chegou aos ouvidos da Santa Inquisição que, farejava toda a região, procurando os acusados de bigamia, judaísmo, heresia, apostasia, blasfémia, e pactos com o demónio, pelo que, o Manel Fernandes foi denunciado, decerto pelos padres, e no dia 13 de Novembro de 1636 já estava preso em Évora, acusado de bigamia, por ter casado com duas mulheres, sendo a primeira ainda viva, foi julgado num auto de fé no dia 14 de Junho de 1637, e recebeu a seguinte sentença: Ficar em corpo com uma vela acesa na mão e açoitado, publicamente sem derramamento de sangue e degredo de 6 anos para as galés, onde serviria ao remo, sem soldo, e ao pagamento dos custos. 

O Manel Fernandes era muito novo, tinha 30 anos, e em Capelins todos os moradores diziam que seria queimado vivo na Praça do Geraldo em Évora, mas não foi, no entanto, esta pena, era a sua sentença de morte, porque, decerto, não conseguia sair das galés com vida, onde tinha de remar nos porões durante seis anos, era muito esforço, seria mal alimentado e, com as doenças e a peste já não voltava, assim, apesar de ele se ter portado mal, a família e amigos uniram-se e com a ajuda de alguns fidalgos da Casa de Bragança, conseguiram novo auto de fé no dia 12 de Agosto de 1637, e foi-lhe comutado o mesmo tempo de degredo, mas no Couto de homiziados de Monsaraz, (prisão aberta, mas não podiam sair dos limites), onde ficou a desempenhar a sua profissão de ferrador, quase em casa, foi só passar a Ribeira do Azevel para lá, porque para cá, estava fora da prisão e sofria as consequências, era bem diferente do degredo nas galés, mas não se livrou das chibatadas em público, semi nu, ou em ceroulas e de vela acesa na mão, ficando com o sangue à flor da pele.  

O casamento com a pobre Maria Pires, de Cheles, naturalmente foi anulado, ela foi enganada pelo Manel, mas teve de prosseguir a sua vida e, mais tarde, a Maria Rita e os filhos, saíram de Capelins, passaram a Ribeira do Azevel e foram ter com ele e ficaram para sempre, nas terras de Monsaraz, a morar no Arrabalde que ficava dentro do Couto de homiziados.

Fim 

Texto: Correia Manuel 


Vila de Monsaraz - Arrabalde





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