domingo, 18 de dezembro de 2022

O mistério dos costumes dos judeus "marranos", em Capelins

O mistério dos costumes dos judeus "marranos", em Capelins

Desde o fim do Império romano que, uma comunidade pequena de judeus se instalou no território que veio a ser Portugal.
Com o passar do tempo, as comunidades judaicas em Portugal continuaram a crescer, também, devido à quase ausência de ideais anti judaicos no país, ao crescimento dos movimentos judeus em Espanha, e depois à sua expulsão dos reinos de Castela e Aragão, e à abertura de novas rotas marítimas e comerciais descobertas pelos portugueses.
No ano de 1492 entraram no reino de Portugal dezenas de milhar de Judeus expulsos dos referidos reinos vizinhos, designados sefarditas, os quais, podiam solucionar o défice de povoamento das terras da raia, mas o casamento do rei D. Manuel I, com Dª Maria de Aragão, tinha uma clausula que o obrigou a pedir ao Papa a instalação da Inquisição em Portugal, embora, só fosse autorizada ao seu sucessor D. João III. os judeus, pelo Édito de Expulsão de D. Manuel I, em 1496, foram expulsos de Portugal, ou tiveram de se converter ao catolicismo.
Alguns judeus abandonaram o Reino de Portugal, mas outros, foram obrigados à conversão ao catolicismo, passando a ser designados cristãos novos, mas muitos destes, continuaram a professar a sua fé em segredo, sendo chamados de "marranos".
No ano de 1536, surgiu o Tribunal do Santo Ofício, ou Inquisição, uma Instituição da Igreja Católica, que perseguia, julgava e punia as pessoas acusadas de cometer crimes de heresia, como era considerado o judaísmo praticado pelos cristãos novos.
Alguns "marranos", perseguidos nos grandes centros populacionais, para sobreviver, foram obrigados a fugir para lugares mais recatados, no interior do Reino, onde estavam mais longe da fogueira e podiam praticar alguns ritos sem serem notados, como aconteceu na Freguesia de Capelins que, devido à sua natural situação geográfica, ladeada por Ribeiras e pelo Rio Guadiana, existiam lugares de difícil acesso, com grandes matagais que davam cobertura à prática da sua fé, no meio de silvados, nos barrancos das Ribeiras de Lucefécit,e de Azevel e do Ribeiro do Carrão e outros, mas os marranos, não se podiam isolar, completamente, do resto da população de Capelins, pelo que, para comunicar entre eles, sobre a sua religião, usavam códigos secretos, que eram simples frases ditas por toda a população, a todo o momento, como: "Que massada", "pagar a sisa", "a carapuça serviu" e muitas outras, eram mensagens entre eles e que, ninguém se apercebia.
Quanto aos ritos que praticavam, na gastronomia, nascimentos, casamentos, óbitos, festejos e outros, conseguiam enganar os capelinenses, mas tinham alguns, que não conseguiam esconder, por isso, encontraram formas para os convencer e envolver nos mesmos, associando cada rito da sua fé a um ato de felicidade ou de infelicidade, do bem ou do mal, diziam que, se não se fizessem assim, podiam ter azar na vida deles, ou da família, ou se fizessem assim, podiam receber uma graça do Senhor, ou ter abundância do que lhe fazia mais falta.
São dezenas os ritos praticados pelos marranos que, inocentemente, foram inseridos na comunidade capelinense, como os seguintes:
- Varrer a casa às avessas, ou seja, do lado de fora para dentro, na sua religião era para impedir a saída da sujidade da sua impureza, mas diziam aos vizinhos que era para não impedir as visitas de voltarem lá a casa e todos faziam o rito.
- Quando alguém falecia, despejavam a água que estava nos cântaros na casa do defunto e, iam ao poço encher os cântaros de água nova, para eles tinha um significado, na sua fé, mas convenceram os capelinenses que a alma do defunto ia lavar-se na água que estava nos cântaros, antes de entrar no céu, levando toda a gente a praticar esse rito, para dar cobertura ao exigido na sua religião.
- Quando alguém falecia, tapavam os espelhos e vidros da casa do defunto, satisfazia a sua fé, mas diziam que era para a alma não se ver ao espelho, senão não podia entrar no céu, e não havia nada pior do que uma alma penada.
- Beijar o pão ao cair no chão, tinha um significado na sua fé, mas convenceram a comunidade que, era o corpo de Deus a cair ao chão e tinha de ser beijado para pedir perdão por o deixar cair, senão podia faltar o pão em casa e vinha a fome.
- Atirar um punhado de terra sobre o caixão quando descia à terra, tem um significado na sua fé, mas outro para os cristãos, a obrigação de participar no enterro do defunto, senão seria mau para o corpo e alma.
- Quando falecia alguém muito chegado, os homens não se barbeavam durante trinta dias, tinha um significado na sua fé e outro para os cristãos, mas dava cobertura ao deles.
- Quando falecia alguém muito chegado, as mulheres tapavam a cabeça com um xaile preto, durante determinado tempo, satisfazia a crença judaica que, ao mesmo tempo, era branqueada pelos cristãos.
- Jurar pela alma do pai ou da mãe, tinha um significado para os marranos, mas outro, para os verdadeiros cristãos, mas que lhe dava cobertura, em caso de denuncia à Inquisição.
- Existiam muitos outros ritos praticados pelos marranos que, eram cobertos pelos adoptados pelos verdadeiros cristãos e que confundiam a Santa Inquisição.
- O jejum era o rito mais praticado pelos marranos, não só na ocasião das grandes obrigações anuais, mas durante as semanas ordinárias, porque, ninguém de fora o notava e muito menos nos Montes e nos campos de Capelins.
Os judeus eram mal vistos na Freguesia de Capelins, embora, a maioria dos seus povoadores, senão todos, eram descendentes, uns de gerações muito distantes e outros nem por isso, mas uma das defesas dos marranos era dizer mal deles próprios, para confundir a Inquisição e, eventualmente salvar a sua família da fogueira.
Através dos apelidos dos seus ascendentes, verificamos que, a maioria dos marranos da Freguesia de Capelins, eram descendentes dos judeus expulsos dos Reinos de Aragão e Castela, dos chamados judeus sefarditas, pessoas com grandes horizontes, sabiam escrever, trabalhavam muito e não perdiam a oportunidade de fazer dinheiro que, depois emprestavam, recebendo altos juros, também, por isso, eram odiados, chegando esse ódio até ao século passado, até nas brincadeiras das crianças, quando alguma era agredida por outra, esta era apelidada de "judeu", o mesmo era dizer mau e afastavam-se dela.
Atualmente, os conhecimentos são diferentes e, quase toda a gente entende que, os judeus são pessoas como qualquer outra, há bons e maus, a diferença, será na religião que professam, em relação às outras.
Fim
Texto: Correia Manuel





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