domingo, 9 de julho de 2023

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi à Santa Cruz de Montes Juntos

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi à Santa Cruz de Montes Juntos

A Festa da Santa Cruz tinha um carácter, essencialmente religioso, mas também profano e, era entendida como a representação de uma pecadora que encontrou Jesus Cristo arrastado e ensanguentado quando estava a ser agredido pelos Judeus em Jerusalém! 

Até ao início da década de 1960, a Festa da Santa Cruz realizava-se no início do mês de Maio nas Aldeias de Ferreira e de Montes Juntos em Capelins, existindo alguma rivalidade saudável, entre estas Aldeias, onde faziam tudo para que a sua Festa da Santa Cruz fosse melhor do que a da outra, obrigando os protagonistas a uma grande dedicação no sentido de alcançarem esse objetivo, que se traduzia num grande orgulho. 

Entre as duas Aldeias, a primeira desistência da organização da Festa da Santa Cruz foi a de Ferreira, continuando a ser realizada em Montes Juntos mais alguns anos, com mais assistência, porque ganhou muita gente daquela Aldeia, principalmente no dia do encontro da Madalena com a Mordama, e foi na manhã desse dia que o avô do Chiquinho disse à avó para depois do jantar (almoço) o lavar e vestir para irem os dois à Santa Cruz de Montes Juntos. 

O Chiquinho ficou, agradavelmente surpreendido, muito contente, porque desde sempre que ouvia contar que a Santa Cruz era uma festa muito bonita e contavam muitas peripécias engraçadas, mas não fazia ideia o que era, porque tinha acabado na Aldeia de Ferreira, onde ele não tinha assistido a nenhuma, por ser muito pequenino, agora, pela primeira vez, ia ver uma Santa Cruz em Montes Juntos. 

O Chiquinho foi logo metido num alguidar cheio de água e, passado com sabão, de alto a abaixo, vestiram-lhe uma roupinha mais nova e, como iam a pé, quase três quilómetros, embora o avô o levasse ao colo em algumas partes do percurso, tinham de ir mais cedo, e lá foram. 

A caminhada correu bem, mas quando chegaram junto à Escola Primária de Montes Juntos, o Chiquinho já se queixava que lhe doíam muito as pernas, mas o avô animava-o dizendo que, já lá estavam e ainda tinham tempo para descansar até à hora do encontro, porém, naquele momento, vinham dois homens, rua abaixo, com alguns foguetes na mão, para os lançarem a anunciar que se aproximava a hora do início da festa e, a poucos metros do Chiquinho, da Escola para cima, o fogueteiro puxou fogo a um foguete que subiu a soprar e a assobiar, pregando grande susto ao Chiquinho que não tinha onde se meter e em pânico meteu-se entre as pernas do avô a chorar e no momento que o foguete estourou nas alturas, o Chiquinho estourou cá em baixo! 

Depois do avô o acalmar, dizendo-lhe que os foguetes não faziam mal e serviam para chamar as pessoas para a festa e para não ter medo, mas começou a notar um cheiro que superava o dos rosmaninhos que pavimentavam a rua, ainda pensou que tinha pisado algum presente, mas depois de averiguar a origem do dito cheiro disse: 

Avô: Ah malandro, estás todo borrado! E agora como é que vais assim para a Santa Cruz? 

Chiquinho: Não estou, não avô! Não fui eu! 

Avô: Pois, não! Fui eu! Olha como tu estás, todo borrado pelas pernas abaixo! 

Chiquinho: Não fui eu, avô! Foram os "fodêtes"!

Avô: Foram os "fodêtes", foram, e agora? 

O Chiquinho insistia para irem para a festa, mas o avô não foi nisso e levou-o para a eira que existia acima da escola, à direita e tentou fazer uma limpeza a sêco, com ervas, palha e tudo o que podia servir, mas ninguém se podia aproximar dele, não havia condições para ir para o meio das pessoas com aquele perfume tão mau e, depois de pensar o que podia fazer, o avô decidiu que tinham de voltar para a Aldeia de Ferreira e, assim foi, para eles, a Festa da Santa Cruz acabou ali.

A viagem de regresso foi muito dolorosa, nem descansaram, por fim, lá chegaram, a avó ficou muito admirada por já estarem de volta e apressou-se a perguntar o que tinha acontecido, e o avô disse-lhe para encher o alguidar com água e TIDE (detergente) e metê-lo lá dentro, porque ele tinha-se borrado todo com medo dos foguetes!

O Chiquinho não perdeu a oportunidade de dizer à avó que não tinha sido ele, tinham sido os "fodêtes" e, acabou assim, a Festa da Santa Cruz de Montejuntos para o Chiquinho de Capelins. 

Fim 

Texto: Correia Manuel   

Aldeia de Montejuntos 

Lugar do caso



 


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