segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi picado pelas vespas

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi picado pelas vespas 

Numa manhã de um dia de verão nos meados da década de 1960, o Chiquinho de Capelins brincava, sentado no chão, com um carrinho feito de uma lata das conservas das sardinhas com umas mulas feitas de cortiça, que puxavam a sua suposta carroça para carregar com terra e pedras de um lado para outro, quando ouviu alguns zumbidos em volta das orelhas, abanou a cabeça para afastar os inconvenientes insetos e continuou a brincar, mas de vez em quando, os ditos insetos faziam uns voos rasantes à cabeça que o assustavam, até que, levantou os olhos para o beiral do telhado da cabana do macho e viu um grande vespereiro, levantou-se do chão e foi a correr chamar a mãe para lhe mostrar o que tinha achado. 

A mãe do Chiquinho andava a tratar da casa e respondeu-lhe que não tinha vagar para ir ver fosse o que fosse, mas perante a sua insistência dizendo que estava ali um enxame, lá foi com ele e, ao ver um vespereiro tão grande, disse-lhe que não se aproximasse mais dali, porque as vespas eram tantas que o mais certo era ser picado e podia ser um caso sério, se fosse alérgico até podia morrer e que  ela na madrugada seguinte logo tratava delas, porque tinha de ser muito cedo quando elas ainda estavam frias devido à baixa temperatura da noite e não tinham força para espetar o ferrão na gente e mesmo assim, o melhor era deitar-lhe uma panela de água a ferver por cima, mas para isso, tinha de empinar ali uma escada, assim o melhor era derrubar o vespereiro com o esborralhador do forno de cozer o pão, um pau comprido, e depois de o apanhar no chão, despejar-lhe a água a ferver em cima e acabavam-se ali as vespas, pelo menos naquele vespereiro. 

O Chiquinho pegou no carrinho de lata e afastou-se daquele sítio e a mãe entrou para casa para continuar a fazer o que antes estava fazendo e ele foi brincar debixo de uma oliveira que estava no meio do quintal, mas sempre a pensar no vespereiro, na maneira de se adiantar à mãe, ou seja, na forma de o derrubar do beiral sem ser ferrado pelas vespas, calculou quantos quilómetros corria à hora e achou que, corria mais do que as vespas voavam, por isso, podia derrubá-lo com o esborralhador e fugir, que as vespas nunca o apanhavam, e se bem o pensou, melhor o fez, deixou a brincadeira, espreitou a mãe e foi calcular a distância entre o esborralhador e o vespereiro para o derrubar e dar à sola, depois de tudo bem planeado e bem medido foi buscar o esborralhador e, pé ante pé, foi-se aproximando do alvo, onde já tinha os olhos postos e bem abertos para no caso de ver algum movimento suspeito estar à defesa, mas parece que, as maganas das vespas também já estavam com o olho nele, porque ainda estava distante e sofreu um ataque inesperado, nem se apercebeu de onde elas apareceram, começou a ouvir muitos zumbidos em volta e, nem teve tempo para se defender, começou logo a ser picado em todo o lado, em volta dos olhos, nos sobrolhos na testa, nas mãos e por aí, atirou com o pau e correu desorientado pela tapada abaixo, até esbarrar na parede lá ao fundo onde foi obrigado a parar a corrida, foi então que teve a certeza que estava todo picado, com imensas dores, começou a chorar alto para a mãe ouvir e acudir-lhe e a mãe, ouviu aquele berreiro e apareceu logo a perguntar-lhe o que tinha acontecido, mas não foi preciso ele responder, porque a mãe viu o esborralhador no chão por baixo do vespereiro e comentou: - Ah malandro, então tu foste espicaçar as vespas a uma hora destas? Agora, tens aí o resultado, anda cá, temos de pôr aí terra molhada senão vais inchar todo! 

O Chiquinho pulava, estrebuchava e chorava baba e ranho, e não se aproximava lá para os lados do vespereiro, a mãe disse-lhe para fazer xixi para cima da terra para ficar molhada, porque era muito melhor do que se fosse molhada com água e, depois começou a pôr-lhe compressas de terra em cima das picadas, mas foi um processo muito doloroso, porque ele não a deixava tocar nos sítios das picadas e, só passadas algumas horas começou a aliviar, ainda inchou um pouco em volta dos olhos, mas graças à mezinha da terra molhada com xixi, durante o dia foi melhorando e à noite estava capaz de outra capeia às vespas. 

O Chiquinho ficou com medo de vespas, mas nunca desistiu de as provocar nas horas que elas tinham pouca força para espetar o ferrão, ou seja, de manhãzinha e mesmo assim, ainda foi picado mais algumas vezes, mas sabia a mezinha a aplicar na picada e, quando isso acontecia tratava-se a ele próprio. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 

Lugar da contenda com as vespas 





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