segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi ver o avião da monda com o tio Manel

Memórias do Chiquinho de Capelins, quando foi ver o avião da monda com o tio Manel 

Numa manhã do mês de Março, nos finais do decénio de 1950, o Chiquinho de Capelins brincava no quintal dos avós em Capelins de Baixo, quando apanhou um grande susto, ouviu, repentinamente um grande estrondo no ar e a terra parecia rasgar, as casas abanaram, correu para casa a tremer de medo e, quase se borrou todo, logo a seguir, ouviram-se gritos e grande alarido na rua, saiu de casa com a tia e a avó ao encontro das vizinhas que, estavam muito assustadas, algumas choravam e outras afirmavam que tinha sido um grande tremor de terra, porque a sua casa quase lhe tinha caído em cima, tinham terra por todo o lado que tinha caído do telhado de telha vã e diziam: - Ai raparigas, ainda tenho as pernas todas (as duas) a tremer, que nem varas verdes, isto foi uma coisa do outro mundo, porque não foi trabalho das feiticeiras, elas não tinham tanto poder para fazer uma coisa destas! Mas as invenções depressa acabaram, não só, porque, o barulho continuava a ouvir-se mais afastado e, ora se aproximava, ora se afastava e, chegaram quase, imediatamente algumas pessoas vindas rua acima a dizer que era uma avioneta ou um avião que tinha feito um voo rasante à Aldeia, porque  andava a fazer a monda com química, das searas de trigo da Casa Dias e aterrava e levantava voo na canada, porque ia encher o depósito de química líquida junto ao poço da malhada, ao lado dos eucaliptos e que já ia toda a gente da Aldeia a correr para lá para assistir ao espetáculo, nunca visto por estas bandas, era um grande avião, valia a pena ir ver e, logo a maioria das vizinhas, nem fecharam as portas das casas e partiram a correr, em grupos, pela Rua do Quebra abaixo, até ao poço da bomba e dali até à malhada, mas o Chiquinho e a avó recolheram a casa e ele continuou a brincar no quintal, mas assim que ouvia o avião a aproximar-se da Aldeia, fugia para dentro de casa com muito medo, mas mesmo com medo, começou a dizer à avó que queria ir lá ver, como foram os outros rapazes, e ela respondeu-lhe que não se importava de ir com ele até ali à parede ao Monte do Meio, de onde se avistava, mas se ele tinha tanto medo do avião, no fim ainda se borrava todo, mas ele continuava a chatear a avó, dizendo: - Oh avó, eu não tenho medo, eu não me borro todo, eu quero ir! E chorava e batia o pé no chão, fazendo uma birra.

Quando o Chiquinho estava com a birra a dizer à avó que queria ir ver o avião, chegou o tio Manel e, ao aperceber-se do que se estava a passar pegou nele sentou-o no suporte da bicicleta, e disse-lhe para se agarrar bem ao selim e partiram pela chapada abaixo na direção de Capelins de Cima e a avó ainda correu pelo quintal a saltar-lhe ao caminho de braços no ar e a gritar: - Não leves o gaiato, Manel, porque ele tem medo do avião! Mas o ti Manel passou por ela e ainda pedalou mais, mas nessa época o caminho entre as Placas e Montes Juntos ainda era só empedrado a bicicleta voava por cima das pedras e o Chiquinho já com o traseiro em brasa, quase não aguentava, mas não se importava, porque o espetáculo que ia ver, compensava as dores que sentia. 

O tio Manel só parou a bicicleta com o passageiro sentado no suporte junto ao poço, onde estavam dois ou três homens, criados da Casa Dias, a fazer as arrumações dos depósitos e utensílios que tinham sido utilizados para misturar a química com água e para encher o depósito do avião, não havia mais ninguém por ali, o tio perguntou aos homens onde estava o avião, e eles responderam que já devia ir chegando a Montoito, onde ia fazer o mesmo trabalho que tinha feito ali, o Chiquinho de certa forma ficou aliviado, porque queria e não queria ver o avião, mas o tio não gostou da resposta e de alguns comentários e zangou-se com um dos homens, esteve o caso sério, porque tinha feito a viagem em vão, não percebia porque se tinha ido embora tão depressa, decerto que não tinha acabado, e os homens afirmaram que tinha acabado a monda ali e havia outras searas à espera do mesmo serviço, para os lados de Montoito.

O Chiquinho e o tio ainda ali estiveram alguns minutos, na esperança do avião voltar, mas não, já tinha levantado voo de Capelins e não voltava, a eles, restava-lhe voltar para casa, onde os esperava a avó com o seu sermão, dizendo que, não devia ter levado o gaiato porque ele estava todo borrado com medo do avião e sabe-se lá o que podia ter acontecido e mais isto e mais aquilo, mas isso para o tio era música para os seus ouvidos e pouco respondeu, o Chiquinho ainda adiantou que, com o tio não tinha medo de nada, e como já vinha com muita fome, sentou-se à mesa, bateu o jantar (almoço) e passou a tarde a brincar descansado, porque, sabia que a avião não voltava para derrubar as casas da Aldeia, uma vez que, já andava a assustar as pessoas de Montoito. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 

À direita da malhada, fica o lugar de aterragem da avioneta da monda




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