quinta-feira, 11 de abril de 2019

A lenda do Manel da boina, de Monsaraz

A lenda do Manel da boina, de Monsaraz  
O Manel António, nasceu no início do terceiro decénio da centúria de 1900, na localidade de Ferragudo, paredes meias com o Convento da Orada, junto à Aldeia do Telheiro na base do Monte em que se ergue a Vila Medieval de Monsaraz. 
O seu pai era seareiro, tinha uma parelha de muares que lhe permitia cultivar algumas courelas suas e outras tomadas ao terço ou ao quarto, ou seja, os cereais que colhia eram divididos entre ele e os donos das courelas naquela proporção e, também tinham algum gado, porcos, ovelhas, cabras, além de patos, galinhas, perús e outros, por isso, o Manel aprendeu muito cedo, todos os trabalhos inerentes à agro pecuária e quando fez a quarta classe, recusou-se a continuar os estudos e continuou a trabalhar com o pai, porém, mais tarde, para ter dinheiro seu, começou a trabalhar nas herdades de Monsaraz. 
O Manel da Boina, ganhou este apelido, porque, quando começou a andar em pé, já usava boina, talvez por isso, demonstrava grande paixão pelas mesmas e, enquanto os outros rapazes do Ferragudo tinham duas ou três, os que tinham, o Manel já tinha mais de uma dúzia e, sempre que podia, lá estava nas feiras de Reguengos com o pai ou com o avô a comprar mais uma ou duas boinas e, se o deixassem, passava horas e horas nas barracas embasbacado a mirá-las uma a uma, com vontade de as levar todas.
O Manel da Boina começou a frequentar os bailes no Ferragudo e nos arredores e, foi num baile na Vila de Monsaraz que se perdeu de amores por uma rapariga que morava no Arrabalde, chamada Maria Bia, começaram a namorar e toda a gente dizia que eram feitos um para o outro, passados cerca de dois anos marcaram o casamento que se realizou na Igreja de Nossa Senhora da Lagoa e, o noivo Manel não dispensou a boina à sua indumentária. 
Os noivos depois de casados, ficaram a morar numas casas que o pai da Maria Bia tinha herdado de um tio sem filhos, ao lado das dele e, devido ao casamento o Manel subiu do Ferragudo para o Arrabalde e alguns rapazes amigos, na brincadeira, diziam-lhe: - É Manel, foi grande subida na tua vida, cá de baixo, lá para cima! E ele muito orgulhoso respondia: - De verdade foi, subi muito na vida e arranjei uma rica rapariga lá em cima! E parece que arranjou! 
O Manel, levou um bom enxoval, mas além dos móveis, roupas e utensílios normais, também levou com ele uma grande catrefada de boinas que, deram muito que fazer à Maria Bia para as organizar, porque não podiam ser misturadas, senão quando ele queria uma de inverno, com orelhas, aparecia uma de verão e vice versa e nunca mais encontrava a que ele precisava para a respetiva ocasião, por isso, a mulher fez a separação por estações do ano e por cores, mesmo assim, quando ele queria uma boina de uma, ou de outra cor, havia sempre grande confusão, virava tudo das avessas e lá estava a Maria Bia para as organizar. 
Como o número de boinas continuava a aumentar, a Maria Bia já não dava conta delas, havia boinas em cima de cadeiras, de mesas, do armário, do guarda louças, em todo o lado, então, ela decidiu tirar as roupas de uma arca de madeira e disponibilizá-la para arrumar as boinas e a arca ficou cheia.
Quando o Manel ia às feiras de Reguengos com outros montesarenses, o primeiro destino dos homens era a feira do gado, mesmo que fosse só para ver o gado e assistir aos negócios de compra e venda, mas o Manel dizia-lhe que já lá ia ter e corria para as barracas das boinas para escolher as que ele achava melhores e mais bonitas e enquanto não comprasse duas ou três a gosto, não ligava a mais nada na feira.
Como o Manel gostava de beber uns copinhos de vinho ou de aguardente, porque eram dos poucos prazeres dessa época, quando tinha tempo livre e, principalmente aos Domingos, dava a volta às tabernas de Monsaraz, ia sempre de boina na cabeça, escolhida a preceito, porque não conseguia sair de casa sem ela, era uma muleta, mas no regresso poucas vezes voltava com ela, quando entrava nas tabernas, em sinal de respeito aos donos e aos outros fregueses que lá estavam, tirava a boina e guardava-a debaixo do braço, mas assim que bebia uns copinhos já não queria saber dela e pendurava-a num cabide se houvesse, ou atirava-a para cima de um banco ou de uma grade das cervejas, das laranjadas ou gasosas e quando abalava, não se lembrava dela e lá ficava, depois como passava por outras tabernas nunca sabia em qual delas tinha ficado, mas como tinha tantas na arca, não se preocupava, havia de aparecer, mas muitas vezes ficava debaixo ou caída atrás das grades das bebidas, ou outros homens a levavam por engano pensando ser a sua e, era menos uma, chegou a uma altura em que na Vila de Monsaraz havia boinas do Manel em todo o lado, as que não ficavam nas tabernas, ficavam caídas pelo caminho do Arrabalde, assim, a quantidade de boinas na arca começou a ficar equilibrada entre as que ele comprava, as que se estragavam com o uso e as que perdia por Monsaraz e arredores, assim, já cabiam todas dentro da respetiva arca das boinas. 
O Manel comprava muitas boinas, mas não perdia menos, e nem Lisboa se viu livre das suas boinas, quando foi numa excursão, escolheu a boina melhor e mais bonita que tinha na arca, aquela era só para ocasiões especiais, como a procissão de Nosso Senhor Jesus dos Passos, por lá andou e, qando voltou a Monsaraz já vinha em cabelo, porque, por esquecimento, deixou-a no banco de um elétrico, ainda se fartou de correr atrás, mas com medo de se perder desistiu e ficou com menos uma boina, mas ainda nesse mês foi à feira de Reguengos e comprou outra, mesmo igual, que guardou na dita arca. 
A paixão do Manel por boinas, era tão grande que, quando foi prestar contas a Deus, dizem que, se apresentou ao São Pedro de boina, por ser esse o seu último desejo. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 








Sem comentários:

Enviar um comentário

Resumo Histórico do Santuário de Nossa Senhora da Boa Nova, de Terena

Resumo Histórico do Santuário de Nossa Senhora da Boa Nova, de Terena  O Santuário de Nossa Senhora da Boa Nova na Vila de Terena, é o Santu...