A lenda dos seareiros de Capelins
Um seareiro era um pequeno agricultor que cultivava pequenas parcelas agrícolas, chamadas courelas, que podiam ser suas, ou de outros proprietários, aos quais, podiam pagar o foro, quando eram aforadas, era assim noutros tempos, e consistia no pagamento de uma renda anual, ou pagavam em géneros, entregando uma parte das colheitas aos donatários das terras, chamado terço, quarto ou quinto, conforme o acordo, e também dependia da qualidade das terras e dos cereais cultivados.
Ser seareiro, era o sonho de muitos moradores na Freguesia de Capelins, porque deixavam de trabalhar nas herdades por conta dos lavradores, trabalhavam por sua conta, mesmo que fosse de dia e noite, eram o patrão deles próprios e, embora fizessem uma agricultura de subsistência, havia quase sempre melhorias económicas no seu agregado familiar, podiam ter animais, como uma, ou duas cabras que lhe davam leite que vendiam ou faziam queijos, podiam ter mais galinhas, porque durante algum tempo davam-lhe de comer a "alimpadura" ou seja, os restos dos cereais que não podiam ser aproveitados para outros fins, ou os farelos que tiravam da farinha de trigo quando a peneiravam para fazer o pão caseiro, podiam engordar um porco, uma vez que, cultivavam além do trigo, outros cereais, como, aveia, cevada, centeio, favas, grão de bico, feijão frade, melão, melancia e outros, depois levavam alguns desses cereais aos Moinhos e mandavam fazer farinha, da qual faziam a "travia" para o porco, ou davam-lhe de comer esses cereais para o engordar e, assim podiam encher a salgadeira com carne e toucinho para todo o ano.
Alguns seareiros seguiam as pisadas de seus pais e avós, que os ajudavam a começar essa vida profissional, outros conseguiam juntar algum dinheiro, trabalhando como jornaleiros, para comprar o essencial, mas também eram ajudados por familiares, vizinhos e amigos, que lhes emprestavam algumas alfaias, quando não lhes estivessem a fazer falta.
Os seareiros, geralmente tinham algumas courelas suas, mas podiam não ter e cultivavam courelas alheias, da forma antes referida, mas tinham de ter uma, ou duas muares, os que tinham duas, chamava-se uma parelha, nesses casos, tinham algumas terras suas e já faziam parte de outro estatuto social, ficando entre o seareiro e o lavrador. Além da muar, ou muares, tinham de adquirir muitos apetrechos, desde cabrestos, cangas, burnis ou munilhas, arreatas, tirantes, guizos, tapetes, cordas, correntes de ferro, carros de tração animal, charruas ou arados, grades e outros acessórios, cuja aquisição custava muito dinheiro, ficando alguns seareiros endividados e com alguns bens penhorados logo no inicio da sua atividade.
Quando em 1262 a Família Riba de Vizela, concederam o Foral a Santa Maria de Terena, ficando seus donatários, foram delineadas várias Coutadas e Baldios no respetivo Concelho, entre os quais, o Baldio do Peral na região que mais tarde foi a Freguesia de Santo António de Capelins.
Todas as Coutadas e Baldios ficaram na posse da Câmara, que os dividia em courelas e distribuía, por sorteio, aos seareiros, os quais, pagavam por elas, uma pequena quantia à Câmara.
Neste conjunto de terras da Câmara, existiam outras courelas que foram aforadas, preços simbólicos, quase todas a militares, ordenanças, ou outros funcionários do Reino que, por sua vez, as aforavam aos seareiros, recebendo uma mais valia, essas courelas criadas em 1262, situavam-se entre a Aldeia de Faleiros e o canto da Igreja de Santo António, encabeçando com a herdade da Sina de um lado e com a herdade de Nabais até ao alto e depois com a Defesa de Ferreira pelo outro, até à primitiva herdade do Seixo, perto da guarita ou marco geodésico dos Barrinhos, junto à atual herdade doTerraço.
Assim, a partir de 1262, surgiram os seareiros no Concelho de Terena, logo, nas futuras terras de Capelins, onde estava situado o dito Baldio do Peral, constituído por quatro Baldios, Barreiros, Manantio, Vale de Martinez e Campo do Garcia, o qual, era administrado pelo povo, pagavam em conjunto uma quantia à Câmara de Terena e dividiam-no em courelas por grande número de seareiros, porém, o número de courelas aforadas, foi aumentando ao longo dos séculos, porque, com o objetivo de povoar as regiões transtaganas, alguns reis, incentivaram, ou obrigaram, os donatários dessas terras a fazer cada vez mais aforamentos a preços baixos, e foi assim que aumentaram o número de courelas, cujas terras, estavam antes integradas nas grandes herdades.
A partir dos finais da centúria de 1600, início de 1700, muitas das ditas courelas foram vendidas ou aforadas a particulares, aumentando cada vez mais o número de seareiros na Freguesia de Santo António de Capelins.
Quando foi criado o Concelho Senhorial ou Comunitário de Ferreira, talvez na centúria de 1400 ou de 1500, cuja Câmara era composta por Alcaide, Juiz, Vereadores, Escrivão, Procurador e Lavradores, foi delineada uma Coutada da Câmara, junto à atual Aldeia de Ferreira, onde, alguns seareiros cultivavam courelas e na qual, os moradores podiam, livremente pastar o gado de trabalho.
No ano de 1836, com o fim do Concelho de Terena e da respetiva Câmara, os seus Baldios foram vendidos e, nos finais da centúria de 1800, a herdade do Carrão foi dividida em courelas e, em duas pequenas propriedades, dando lugar a mais alguns seareiros nesta Freguesia.
A vida de seareiro era dura, nada fácil, porque, se chovia muito, era mau para as culturas, e nos anos sêcos, sem chuva, não colhiam quase nada e, algumas famílias de seareiros passavam por muitas dificuldades, podiam ficar endividados ou serem obrigados a vender as courelas para pagar as dívidas.
Pelo seu grande contributo para o desenvolvimento da Freguesia de Capelins, pelo que passaram, prestamos esta modesta homenagem aos seareiros, nossos ancestrais.
Bem Hajam
Fim
Texto: Correia Manuel
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