segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Memórias do Chiquinho de Capelins, do baile à luz de um trator

Memórias do Chiquinho de Capelins, do baile à luz de um trator 

Após a revolução do dia 25 de Abril de 1974, seguiu-se um período revolucionário, cheio de peripécias e algumas tentativas contra revolucionárias rematadas por festividades por quem achava que vencia e, nunca houve tantas festas em Portugal. 

Nas terras de Capelins, além das festas anuais em honra dos respetivos oragos, começaram a organizar outras, para divertimento da comunidade, a maioria compunham-se de vacadas à tarde e de bailes à noite, em qualquer fim de semana, fosse, ou não, para festejar um acontecimento bem sucedido para o povo, e como os bailes ficaram isentos de licença, antes era emitida pela Câmara, assim como, da presença da Guarda Republicana, diminuíram os custos de organização, apenas faziam o pagamento aos acordionistas, quase sempre, o senhor Pinto, de Borba, o senhor Cochicho, de Vila Viçosa, o capelinense Joaquim José Aleixo, o vizinho Bento Canhão da Aldeia do Rosário e outros, nessa época, eram bailes e mais bailes. 

Um dia, surgiu a notícia de que ia haver um baile na Aldeia de Ferreira, como nunca tinha havido, seria abrilhantado por vários acordionistas, entre os quais, o capelinense senhor Manuel João Figueiras que, viria acompanhado de outros acordionistas residentes na Baixa da Banheira ou arredores e como toda a gente, mais, e menos nova, se manifestou que estaria presente, o organizador, viu-se de mãos atadas, porque estava visto que o seu casão dos bailes não suportava nem um quarto das pessoas que estariam presentes e não era tempo para o baile se realizar ao ar livre, e começou a dar voltas à cabeça, a pensar como podia resolver esse dilema e, tanto pensou até que encontrou a solução, foi falar com o senhor António Chambel que era rendeiro da herdade da defesa de Ferreira, incluindo o Monte Grande, para ele lhe ceder um grande casão que fazia parte dos currais do gado na eira do Monte, o qual, servia para guardar as alfaias agrícolas e a palha para as vacas. 

O senhor Chambel depois de ouvir o pedido e de se informar que se destinava a fazer uma grande festa para o povo, não hesitou em ceder as referidas instalações que, exigiram muito trabalho  para ficarem em condições de poderem ser usadas para o dito fim. 

No dia do tão afamado baile, as ditas instalações estavam limpas, com um palco improvisado e, com tudo o que era necessário, fios elétricos com lâmpadas,  ligados, provisoriamente a partir de um enxerto feito pelo senhor Chambel que, era lavrador, mecânico, eletricista e fazia de tudo e esforçou-se para que fosse uma noite inesquecível para o povo. 

Quando começou a escurecer, acenderam as luzes da via pública e, algumas pessoas começaram a aproximar-se do recinto do baile, porém, pouco depois deu-se um apagão e as pessoas comentaram: - Olha, acabou-se a luz, mas não deve demorar em aparecer, de vez em quando acontece isto e depois carregam lá num botão e acende, ou vem cá o eletricista que mora ali em Terena, é só carregar num botão ali na cabine e fica resolvido. 

O tempo foi passando e a luz não voltava, e chegavam cada vez mais pessoas de toda a região, o organizador do baile, entretanto, telefonou ao eletricista que chegou, rapidamente e ficou desolado ao verificar que era uma situação muito grave, tinha havido um curto circuito e queimado parte do posto de transformação, não conseguia resolver a tempo de dar luz ao baile, tinha de substituir várias peças que nem tinha ali, nem em Terena, e disse que a eletricidade só estaria de volta pela madrugada ou no dia seguinte.

O senhor Chambel ia quase todas as noites para Montoito, onde morava, mas nesse dia ficou no Monte até mais tarde e quando lhe contaram que não conseguiam arranjar a eletricidade até à hora do baile, prometeu que resolvia o problema, levou logo um trator para junto do casão, começou a fazer ligações de fios aos faróis e a todo o sistema elétrico do trator e, com ele sempre a trabalhar, conseguiu dar boa luz para a realização do grande baile que durou até de madrugada, à luz de um trator. 

O senhor Chambel foi incansável, decerto ficou prejudicado, mas fez isso pelo povo de Capelins, que ele achava que o merecia. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 


Casão do baile - Aldeia de Ferreira 



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