segunda-feira, 7 de abril de 2025

Aldeia de Vila Real - Juromenha - 1758

História e estórias do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes

10 - Aldeia de Vila Real - Juromenha - 1758

A descrição do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes, em resposta ao Inquérito do Marquês de Pombal, escrita pelo Cura, Padre Francisco Dias Mendes, nas Memórias Paroquiais de Nossa Senhora da Assunção, Aldeia de Vila Real - Juromenha, em 02 de Abril de 1758. 

Rio Guadiana

"O celebrado rio Guadiana divide esta Freguesia de Nossa Senhora da Assunção de Vila Real, pela parte do Poente com a Freguesia da Matriz da Vila de Juromenha.

O rio Guadiana é caudaloso e dizem que tem seu nascimento nas serras do Reino de Aragão e que, no Reino de Castela passa de muita distância e se mete e some-se pela terra e que vem a sair dali quatro léguas ou as que na verdade forem, o que tudo é tradição, este rio vai meter-se nas vizinhanças de Mértola.

São várias as Ribeiras de que toma as suas águas para fazer a sua corrente, entre elas as de que tenho notícia no Reino de Castela são as da parte do Nascente a Ribeira de Albecira, a Ribeira de Val Verde e pela parte do Poente é a Ribeira de Xeuta. 

Em Portugal pela parte do Nascente é o Ribeiro de Alfornel que é no distrito desta Freguesia e o Ribeiro do Freixial no dito distrito pela parte do Poente se mete no dito Guadiana. 

A Ribeira de Caia e a de Varxe que são no Termo (Concelho) de Elvas. 

No Termo (Concelho) de Juromenha se metem no dito rio Guadiana a Ribeira de Mures e a Ribeira de Alagoa. 

A Ribeira de Pardais e a Ribeira de Alcalate que é no Termo (Concelho) do Alandroal. 

A Ribeira de Lucefece que é no Termo (Concelho) de Terena, e nos mais que se enumerem no dito rio não tenho notícia.

As águas do dito rio não servem de mais utilidade que para os moinhos para moer pão, por serem as margens do dito rio de areias secas e cascalho e em outras partes de safras tornam-se infrutíferas.

Tem esta Freguesia no seu distrito um Pégo chamado Pégo Pôdre separado da corrente do rio Guadiana que de Verão se lhe corrompem as águas por cujo motivo se chama Pégo Pôdre, cria esse uma qualidade de peixes a que chamam Carpias e Tencas além de outros que se acham na mais água doce que não são ditos na estimação.

E não pude descobrir mais nada do que se procura saber, e por verdade me assinei, Villa Real em 02 de Abril de 1758.

O Cura de Vila Real

Padre Francisco Dias Mendes" 


Comentário

É mais uma página histórica do celebrado rio Guadiana e dos seus afluentes, como eram nesta região em 1758, porque, em cada Freguesia ribeirnha existe sempre mais alguma Ribeira ou Ribeiro com as suas caracteristicas e afluentes do rio Guadiana. 

Neste caso, embora alguns cursos de água mencionados, não sejam  desta Freguesia, o Padre Francisco Dias Mendes, destaca os seguintes:

Ribeira de Albecira - Espanha;

Ribeira de Val Verde - Espanha;

Ribeira de Xeuta - Espanha

Ribeiro de Alfornel - Vila Real;

Ribeiro do Freixial - Vila Real;

Ribeira do Caia - Elvas;

Ribeira de Varxe - Elvas;

Ribeira de Mures - Juromenha;

Ribeira da Alagoa - Juromenha;

Ribeira de Pardais - Alandroal;

Ribeira de Alcalate - Alandroal;

Ribeira de Lucefece - Terena.

Quanto ao lugar do nascimento do rio Guadiana, não é muito diferente da descrita pelo Prior da Matriz da Vila de Juromenha, e de todos os outros nove Párocos das localidades ribeirinhas.

O Padre também respondeu que, o rio se metia pela terra dentro, em vários pontos do seu percurso, no reino de Espanha, sendo subterrâneo durante várias léguas, neste caso, só já eram quatro, ou as que fossem, mas não há duvidas que, o mito do rio que aparecia e desaparecia pela terra dentro existia por toda esta região e havia algum fundo de verdade, como já verificámos essa informação é dada por outros Párocos, como o da Paróquia de São Tiago de Monsaraz, talvez o Pároco que mais escreveu sobre o rio Guadiana nesta data, escrevendo, também, que, este rio em terras de Espanha, ora se escondia por baixo da terra, ora aparecia à superficie, mas quando entrava no Reino de Portugal isso acabava.

O Cura de Vila Real respondeu que o rio era caudaloso e cheio de peixes, mas nada escreveu sobre as espécies de peixes que criava nem às pescarias, mas achou mais interessante referir os peixes existentes num Pégo, qua não era no rio Guadiana e designava-se por Pégo Pôdre que criava carpias e tencas além de outros peixes de água doce.

Para este Padre o  rio Guadiana, desaguava ou meti-ae no mar nas vizinhanças de Mértola.

Sobre a utilidade das águas do rio Guadiana, o dito Padre respondeu que apenas serviam para os moinhos moer pão, por as suas margens serem de areias secas e cascalho. 

O Cura Francisco Dias Mendes, não respondeu a várias perguntas, não devia ser admirador do Marquês de Pombal ou não estava disposto a dar muitas informações sobre o rio Guadiana, não respondeu sobre a direção da corrente, se era para Norte, Sul, Nascente ou Poente, nem se criava peixes, e quais as espécies e os que havia em maior abundância, se havia pescarias e em que tempo do ano, e se eram livres, se o rio tinha, ou não, sempre o mesmo nome em todo o seu curso, se tinha tido outro nome, se tinha pontes e em que sítio. O padre resolveu essas respostas escrevendo que, não pôde descobrir mais nada sobre o que o senhor Marquês procurava saber e adeus.

Fim 

Correia Manuel 


De: Memórias Paroquiais de Vila Real - Juromenha 




domingo, 6 de abril de 2025

Nossa Senhora das Candeias - Vila de Mourão - 1758

História e estórias do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes

9 - Nossa Senhora das Candeias - Vila de Mourão - 1758

Respostas do Prior Estevão da Silveira Matos, da Paróquia de Nossa Senhora das Candeias - Vila de Mourão, ao Marquês de Pombal Sebastião José de Carvalho e Melo Secretário de Estado do Reino (Primeiro Ministro) do rei D. José I, em 05 de Junho de 1758.

Rio Guadiana

"Chama-se o rio desta Vila, Guadiana, nasce na Mancha do Reino de Aragão.

Dizem que logo no seu nascimento é grande, quando passa por esta terra distante um quarto de légua é rio que se não pode vadiar no inverno por ser muito caudaloso, porém no verão se passa a pé enxuto.        

No Distrito desta Freguesia se metem no rio Guadiana uns pequenos Ribeiros a que chamam das Vinhas e Aldrogas. 

Navegam no rio barcos pequenos de pescadores, e neste Distrito os não pode fazer pessoa alguma para o fim de passar de uma e outra parte gente, porque tem o mesmo rio uma grande barca de que o Senhor Rei D. Manuel fez Mercê ao Alcaide Mor desta Vila que serve de passar gente, bestas, gado e tudo o mais.

Corre este rio por entre muitos Montes e por essa causa sempre que corre neste Distrito é arrebatadíssimo.

Corre este rio de Nascente para o Poente.

Cria várias castas de peixes como são: escárpios que têm tirado seis e sete arates, barbos de arroba, lampreias, irozes, pricóis, bogas, bordalos, sebatelhas (pardelhas ?) e mais variedades de peixes pequenos.

Há nesta terra pescarias no inverno e têm os moradores disto poucos cais feitos dentro do rio onde pescam à cana com a melhor arte, porque com um subtil anzol encastado em sidela de dez ou doze sedas de canalho tiram ajudados da arte que a esperiência lhe tem ensinado dos maiores peixes que tem o rio e em todo o ano se pesca com os barcos e redes.

São as pescarias livres e só a cascalheira do Moinho de Valadares tem direito Senhorio.

Neste Distrito não tem o rio arvoredos, tem algumas margens em que semeiam melões e feijoais grandes.

É a água deste rio excelente para os estraidos do baço, porque por dentro do rio há inumeráveis tramagueiras. 

Sempre conservou o seu nome, e conserva até se meter no mar.

Morre este rio no mar. 

Tem este rio muitos açudes e penhascos que impedem o ser navegável não tem cachoeira nem represa neste Distrito.

Neste Distrito, não tem pontes, nem de pau nem de pedra.

Tem neste Distrito quatro Moinhos, e não tem outro engenho. 

Nunca ouvi dizer que das suas areias se tirasse ouro ou prata.

Usa-se das águas deste rio livremente sem pensão alguma. 

Nasce nas Manchas de Aragão e entra no mar junto a Mértola, passa por inumeráveis povoações.

Estevão da Silveira Matos, Conventual de Avis e Prior na Igreja Matriz da Vila de Mourão. Certefico que em verdade de uma ordem do Excelentissimo Reverendissimo Senhor Dom Frei Miguel de Távora Arcebispo de Évora, respondi aos Interrogatórios,inclusos neste papel na forma que no mesmo o contém e nada mais tendo que dizer do que vai respondido em cada um dos Interrogatórios, passa o referido na verdade assino e firmo pelo hábito que professo.

Mourão cinco de Junho de mil setecentos e cinquenta e oito. 

O Prior: Estevão da Silveira Matos"

Transcrito por: Correia Manuel

Abril 2025 


Comentário 

O Prior Estevão da Silveira Matos, descreveu como era o celebrado rio Guadiana na Freguesia de Nossa Senhora das Candeias, logo no Concelho de Mourão, na centúria de 1700, ou seja, em 1758 e, não difere muito do que os Párocos das localidades de toda a região a juzante até Juromenha o descreveram nas respetivas regiões.

O Prior respondeu que, o rio Guadiana passava a cerca de um quarto de légua, 1,5 kms da vila de Mourão e que a sua nascente era nas manchas de Aragão, corria do Nascente para o Poente e era um rio caudaloso no inverno, com corrente arrebatadíssima porque, aqui corria entre muitos montes, mas no verão passsava-se a pé enxuto.

Escreveu que, nesta Freguesia entravam nele alguns pequenos Ribeiros como o Ribeiro das Vinhas e o Ribeiro de Aldrogas, que o rio era navegável por pequenos barcos de pesca que no distrito ou área desta Freguesia, não podiam passar gente entre as suas margens, porque para isso, existia uma grande barca que o rei D. Manuel I tinha doado ao Alcaide Mor da Vila de Mourão que servia para passar gente, bestas, gado e tudo o mais. 

Quanto às espécies ou castas de peixes que descreveu, são as mesmas que existiam desde Juromenha, os escárpios, talvez carpas, com seis e sete arrátes, ou seja, três ou quatro kgs, os barbos com uma arroba, quinze kgs, as bogas, lampreias, eirozes ou irozes, pricóis, sebatelhas, bordalos e outro peixe mais miúdo, havia pescarias e o povo tinham um cais dentro do rio de onde pescavam com canas, com grande arte, grandes peixes, mas pescavam todo ao ano com os barcos e redes. As pescarias eram livres e só a cascalheira do Moinho de Valadares tinha Senhorio. 

A água do rio era excelente para os extraídos do Baço, porque por dentro dele havia inumeráveis tramagueiras. 

Também, este Prior da Vila de Mourão, escreveu que o rio Guadiana, nunca teve outro nome, mas desde a reconquista destas terras pelos portugueses até 1580, conforme consta em imensos documentos régios e na história de Portugal, chamou-se rio Odiana, quando do domínio do Reino de Portugal pelo Reino de Castela, 1580-1640, passou a ser o rio Guadiana, tal como já assim se chamava em Castela, há aqui um mistério, porque, nenhum Pároco entre Juromenha e Mourão, referem que, antes, era o rio Odiana.

O Prior escreveu que, o rio tinha muitos açudes e penhascos que o impediam de ser navegável em todo o lado, não tinha cachoeiras nem represas e não tinha pontes, nem de pau nem de pedra neste distrito, ou Freguesia, existiam aqui quatro moinhos e mais nenhum engenho.

Referiu que o rio passava por inumeráveis povoações e entrava no mar em Mértola, neste caso, os Párocos combinaram-se todos em informar que o rio Guadiana desaguava no Oceano em Mértola, e isso ouviu-se até muito tarde, e tinha um fundo de verdade, já que, as marés influenciam a corrente do rio até esse Lugar.

E por aqui se ficou, o Prior Estevão da Silveira Matos, fazendo grandes despedidas ao senhor Marquês de Pombal. 

Não deixa de ser mais uma página histórica sobre o celebrado rio Guadiana, neste caso, da região de Mourão, na centúria de 1700.

Correia Manuel 

Abril de 2025 


Vila de Mourão 




sexta-feira, 4 de abril de 2025

Nossa Senhora da Lagoa - Vila de Monsaraz - 1758

História e estórias do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes

8 - Nossa Senhora da Lagoa - Vila de Monsaraz - 1758

Respostas do Pároco António José Guião, da Paróquia de Santa Maria da Lagoa - Vila de Monsaraz, ao Marquês de Pombal Sebastião José de Carvalho e Melo Secretário de Estado do Reino (Primeiro Ministro) do rei D. José I, em 21 de Junho de 1758. 

Rio Guadiana

"No que pretende ao rio, pelo distrito (pela Freguesia) na distância de meia légua (mais ou menos 2,5 Kms) na parte do Nascente passa o rio Guadiana, que corre para o meio dia e dizem que tem sua nascente nas manchas de Aragão Reino de Castela, corre todo o ano.

Dizem que nasce de umas fontes com pouco caudal de águas e à vista desta freguesia passa entre Mourão e Monsaraz.

No distrito desta freguesia não entra no rio Guadiana outro algum rio.

É este rio Guadiana navegável com barcos de dois remos de que usam para pescarias.

É de curso arrebatado por passar entre terras montanhosas. 

Corre este rio do Nascente  para o meio dia. 

No mesmo rio Guadiana criam-se muitas bogas, barbos, escárpios, sebarelhos?, bordalos, e eirós e alguns anos de inverna lampreias, porém a maior abundância são bogas e barbos. 

Neste rio se pesca todo o ano, por divertimento. 

Têm as suas águas virtudes para degerir, e de verão servem de se tomar banhos para várias enfermidades.

Não há memória de que este rio tivesse outro nome.

Morre este rio no mar Oceano junto a Mértola por entre um grande rochedo onde fazem grande queda as águas por cujo impedimento lhe impede o ser navegável. 

Não me consta que tenha pontes este rio mais do que uma entre Badajoz e Elvas. (Hoje, em Portugal tem sete, e parece que vão ser oito, além do paredão da barragem de Alqueva).

É este rio todo povoado de Moinhos de moer pão, no distrito da minha freguesia se acha um moinho chamado Mendonça, antiquíssimo que dizem tem um letreiro em uma pedra que diz ser feito antes da vinda de Cristo ao mundo trezentos anos.

Nesta Freguesia não usam os moradores as águas deste rio para cultura dos campos por serem terras fragosas.

No distrito desta Freguesia passa este rio entre Mourão e Monsaraz como ficou dito.

Estas são as notícias que posso dar a V. Exª Rmª segundo os interrogatórios que me foram dados, nos quais procurei ser breve para não massar V. EXª a quem desejo todas as felicidades e a quem peço humildemente a benção com o humilde subdito Monsaraz de Junho 21 de 1758. 

De V:Exº Rmª

Humilde subdito, um muito obrigado

O Prior de Santa Maria da Lagoa

António José Guião"



Comentário

Parece que, o Pároco, António José Guião, da Paróquia de Santa Maria da Lagoa da Vila de Monsaraz, não estava na disposição de dar muitas informações sobre o rio Guadiana e seus afluentes, ao Marquês de Pombal, como fez o seu colega Pároco da outra Freguesia, a de São Tiago de Monsaraz, Manuel Gomes Cunqueiro Velho, o qual. escreveu pelos dois, e de verdade, não havia necessidade de repetir tudo.

O Pároco António José Guião, escreveu que, a nascente do rio Guadiana era nas manchas de Aragão de duas fontes com pouco caudal, mas corria todo o ano, era de corrente arrebatada por correr entre terras montanhosas e que corria do Nascente para o meio dia.

O rio Guadiana na freguesia de Nossa Senhora da Lagoa, passava entre a Vila de Mourão e a Vila de Monsaraz, e era navegável com barcos de dois remos, neste caso, não referiu à barca que fazia os transportes entre Mourão e Monsaraz, talvez, porque, o outro Pároco já tinha dado essa informação, mas as freguesias eram distintas em termos de limites de espaço geográfico. 

Este Pároco, respondeu que, as espécies de peixes que mais existiam no rio Guadiana nesta região, eram as bogas, escárpios, barbos, bordalos eirós e outros e aqui faziam pescarias todo o ano para divertimento.

Respondeu que, as águas do rio Guadiana tinham virtudes para digerir e que, no verão tomavam banho nas suas águas para tratamento de várias enfermidades. Neste caso, não leu o livro do Brito, no qual, este não aprecia estas águas. 

O Pároco informou que, o rio Guadiana nunca teve outro nome, mas esqueceu que, o seu nome, desde a reconquista destas terras aos mouros, cerca de 1230 até 1580, foi sempre rio Odiana, depois, quando o Reino de Portugal esteve no domínio de Castela, ficou com o mesmo nome em toda a sua extensão, ou seja, Guadiana.

Escreveu que, era muito povoado de moinhos, e na Freguesia existia um Moinho chamado do Mendonça que diziam, tinha lá um letreiro numa pedra onde estava escrito ter sido construído trezentos anos antes do Nascimento de Jesus Cristo, logo, esse Moinho, em 1758 teria a idade de: 1758+300= 2058 anos.

Como não devia ter vontade de escrever mais, o Pároco despediu-se escrevendo que, procurou ser breve para não massar o senhor Marquês de Pombal. 

Assim, ficamos com mais uma página histórica do celebrado rio Guadiana, neste caso, da região de Monsaraz que, pode ser comparado com o espaço geográfico a juzante, até Juromenha, ou seja, como era na centúria de 1700.

Fim 

Correia Manuel 

Abril de 2025

De: Memórias Paroquiais de Nossa Senhora da Lagoa, de Monsaraz - 1758 


Igreja de Nossa Senhora da Lagoa - Monsaraz



terça-feira, 1 de abril de 2025

São Tiago - Vila de Monsaraz - 1758

História e estórias do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes


7 - São Tiago - Vila de Monsaraz - 1758

Respostas do Pároco Manuel Gomes Cunqueiro Velho, da Paróquia de São Tiago - Monsaraz, ao Marquês de Pombal Sebastião José de Carvalho e Melo Secretário de Estado do Reino (Primeiro Ministro) do rei D. José I, em 16 de Junho de 1758.
Rio Guadiana
"Junto desta Vila na distância de meia légua corre um rio que divide este Termo do de Mourão, chama-se este, Guadiana, nos nossos campos, seguindo o nome é Mourisco, conforme diz Brito na Geografia que traz assim da sua Monarquia Portuguesa folha 564, a qual, antigamente segundo o mesmo e Espinola p. 5ª folha 157 o chama de Anna, nasce conforme todos afirmam na Mancha de Aragão de duas lagoas, uma das quais está junto a um Povo chamado Messas e outra mais ao meio dia junto a Vila Nova dos Infantes diz o mesmo Brito. E segundo Bluteau Lit. Guadiana nasce perto das Montanhas de Consuegra junto a um Lugar chamado Carhamares numas Lagoas de água chamam Olhos do Guadiana. Tem este rio outro nascimento conforme afirmam todos, porque depois de nascer no dito Lugar e deixar-se ver de alguns outros que rega com duas águas a outros as furta metendo-se por baixo da terra ocultando o seu curso por espaços de seis ou sete léguas desde Arganassil até à vista do Bamiel, conforme Espinolla e Brito e segundo Bluteau torna a aparecer junto de Vilharca, onde nasceu, o dizerem os naturais da Terra, que tem uma ponte em que de ordinário passam tantas mil cabeças de gado como se podem acomodar em sete léguas, Bluteau diz que lhe deram este nome, porque Anas em latim quer dizer Ade e ao modo desta Ave que mergulha e torna a vir à flor da água. Oculta-se este Rio debaixo da terra e dali a certo espaço se faz visível, sobre o que disse um discreto:
Guadiana rio de Espanha
Se encubre por largos trechos
Chegando a outros veraz
Solto por campos diversos.
São as águas deste Rio diz o mesmo Brito muito pouco gostosas e de menos recriação à vista pela cor escura, e triste que levam, enquanto ao gosto das águas é certo, mas pelo que respeita ao motivo do escurecimento apaixonado, porque ainda que em algumas partes pareçam escuras é pelos grandes re.. que os cercam e pela muita fundura que alguns pegos têm que ainda não se dá esta razão, certamente, não é assim e ainda que por Guadiana seguindo o Mourisco sejam suas águas escuras e tristes seguindo o Cristianismo pra águas e Ana, nunca podem deixar de serem engraçadas.
Corre ordináriamente todo o ano e só em anos tão secos como experimentamos em que deixa de correr.
Rigorosamente rios não tenho notícia que outros entrem no Guadiana, mas Ribeiros muito grandes alguns, como Ardila no Termo de Moura, o Degebe no Termo de Portel, e junto a esta Vila entra neste rio um Ribeiro grande chamado Azavel o qual divide para a parte do Norte o Termo de Monsaraz com o de Terena e entra em Guadiana para a parte do Nascente junto a um Moinho, chamado o Moinho do Gato. Não corre este Ribeiro mais do que de inverno e para este tempo tem vários Moinhos junto a esta Vila e todos em seu Termo Concelho). Tem grandes pegos em que se conservam peixes muito grandes e tem de toda a qualidade de peixes que há no rio. Neste Ribeiro junto à Guadiana entra outro chamado Pêga que tem seu princípio nas estremas desta Freguesia, com a do Corval da parte do Poente, o qual tem um Moinho junto à entrada do Azavel, a este se comunicam pardelhas bordalos picões e algumas bogas.
Navega-se neste rio com barcos pequenos que com dois remos os governa um homem só, de que usam para pescar e levar pão para os Moinhos, mas para as comunicações dos povos navega-se com barcas que com dois remos as governam, como a de Elvas, Juromenha, barca de Cheles Vila de Castela, que desembarca no Termo de Terena, barca de Mourão, que embarcam neste Termo (Concelho) distante meia légua desta Vila, barca de Moura e barca de Serpa e não é capaz de outras embarcações.
É de curso muito arrebatado nas enchentes, porque indo recolhido é de curso quieto, e na verdade em seis de Janeiro deste presente ano (1758) teve uma enchente tão extraordinária como os que são nascidos nunca viram, a qual causou perda muito considerável não só a Castela, mas também a Portugal, assim em gados e homens que afogou como em ruínas em casas, moinhos, e arvoredos fez.
Corre o descrito para Poente dizem o Espinolla e o Brito, em chegando a Badajoz deixa este caminho e lança-se contra o meio dia até dar no Mar Oceano Atlântico.
Cria grande abundância de peixes e os que trás em maior abundância são bogas, cria muitos e grandes barbos, alguns tão extraordinários que pesam uma arroba, como os têm pescado em cordas, cria também grandes escarpios, tencas, eirós, sebatelhos, e em alguns anos pescam-se nos caneiros muitas e grandes lampreias.
Em todo o ano há pescarias conforme o tempo, mas quase todas são por divertimento nestas partes, porém o mais comum e ordinário, são em Fevereiro, Março e Abril, que é quando costumam pescar os peixes grandes, assim nas cordas, como nos cevadouros, que para isto lhe fazem.
Todas as pescarias são livres neste rio e só na distância de uma légua desta Vila a cascalheira do Moinho de Valadares é particular do dono da Herdade das Pipas de baixo, que as cascalheiras são lugares de cascalho que as Ribeiras juntam onde as bogas costumam desovar.
Na distância da Freguesia de Santa Maria pouco se cultivam as suas margens, porque na distância que alcança a Coutada, não se semeia, depois continuam as herdades da mesma Freguesia e comumente são penhascos e terras muito fragosas, rigorosamente não tem margens junto a nós este rio. Não se cultivam senão algumas vagas em que presumem não poderão chegar as enchentes, e só no verão em algumas arcas ou ribanceiras fazem meloais. Nesta distência que uma légua grande não tem arvoredo silvestre, e só dentro do mesmo rio há muita tarrafeira, sarço, no circuito desta Vila tem oliveiras, zambujeiros e azinheiras.
Neste rio costumam muitas pessoas para certas queixas tomar banhos no verão por conselhos dos Médicos e tem virtude as suas águas para fazer degerir e comer, para o estômago dizem que por causa da muita tarrafeira que em si tem o rio.
Sempre conserva o mesmo nome e o mais que podia dizer neste particular e interrogatório e no seguinte me remeto ao que já respondi no primeiro e sexto interrogatórios.
São tantos os açudes neste Rio como são os Moinhos e não só por esta causa não é capaz das embarcações, como pelos muitos e grandes rochedos, e pelo pouco fundo que em muitas partes tem, porque em anos secos o veem quase todo o ano, e o ordinário é? do mês de Maio por diante, assim só andam as barcas em pegos que estejam livres destes obstáculos.
Junto à cidade de Badajoz tem uma grandiosa ponte de cantaria, porém em Portugal não tenho notícia que tenha mais pontes que a da cidade de Elvas, a qual se danificou no tempo das guerras.
Tão povoado está de Moinhos este Rio que entendo não há lugar com capacidade para tal ministério que deixe de os ter, ao presente quase todos são Rodetes, porque podendo-se contar há quarenta anos quantos destes teria o Guadiana, sendo tantos os Moinhos, hoje podem-se contar quantos são os rodízios sendo tantos os Moinhos de Guadiana. Rodetes são uns Moinhos que debaixo têm um poço da altura de homem e meio e alguns têm poço de altura de dois homens em que anda a roda debaixo de água e assim tanto que a água não entra na casa do Moinho, já pode trabalhar porque não tem os rodízios que é necessário que a água os não quebre para que possam moer, e por esta causa o Guadiana em anos ordinários de chuva não podia moer senão de verão, hoje porém em anos ordinários moem a maior parte do ano, em anos secos todo o ano moem.
Contra a evidência é o dizer do Brito no lugar acima citada que a farinha deste rio ainda sendo de bom trigo, é feita com boas pedras já é ordinariamente negra e de ruim cor porque o contrário vemos nós a todas as horas e se acaso assim sucede algumas vezes não é pela causa que o autor aponta, é sim pelo muito tempo que as pedras estão debaixo de água por causa das enchentes serem muitas, e grandes como sucedeu este ano que estiveram cinco meses, ou é esta a principal causa porque quase todos os Moinhos são Rodetes e estes se movem com tanta velocidade que dando-lhe pouco trigo queimam a farinha, cheira a chamusco daqui nasce o sair muitas vezes preta, por descuido dos mesmos que governam os Moinhos o que não sucede no Moinho de Rodízio. Assim, se as pedras e o trigo são bons como ele supõe a farinha também não tem defeito e verão que pode participar a água ao trigo e a água que já muito dá nas rodas lhe comunica o movimento por um veio de ferro. Seguir-se-ia daqui que farinha feita com água turva era menos perfeita do que a farinha feita com água clara, e é contra. Isto quem o dirá se a água não toca na farinha, nem nas pedras.
São suas águas livres e sem pensão, porém não tenho notícia que dela se aproveitem em Portugal para cultura dos campos.
As cidades ou vilas e seus Termos (Concelhos) que a Guadiana banha com suas águas, de Castela conforme Bluteau são Calatrava, Mérida, Medelin, Badajoz e junto a este povo são Cheles, Alconchel e Vila Nova del Fresno, e de Portugal são Elvas, Olivença, Juromenha, Alandroal, Terena, Monsaraz, Mourão, Portel, na distência de quatro léguas, Moura, Serpa, Beja, Alcoutim e entendo que Mértola.
Estas as notícias que da forma de interrogatórios posso participar a Vossa Excelência Reverendíssima cuja pessoa o congratula por felizes e dilatados anos como todos os seus subditos necessitam e pedem. Monsaraz 16 de Junho de 1758.
Excelentíssimo Reverendíssimo Senhor
De Vossa excelência Reverendíssima
Humelíssimo e Obedientíssimo Subdito
Pároco Manuel Gomes Cunqueiro Velho"
Fim
Transcrito por: Correia Manuel
Março de 2025

Comentário:
Conforme podemos verificar o Pároco Manuel Gomes Cunqueiro Velho, da freguesia de São Tiago de Monsaraz, nas respostas ao Inquérito do Marquês de Pombal, nas Memórias Paroquiais de 1758, sobre o celebrado rio Guadiana, consultou alguma literatura, de autores que, escreveram sobre o dito rio, sendo um trabalho muito exaustivo, porque, além da informação local, teve o referido apoio, embora o Pároco, não se mostrasse de acordo com um dos autores, o Brito, (pensamos, referir-se a Frei Bernardo de Brito, que nasceu em 1569 e faleceu em 1617, deixando imensas obras, entre as quais, Monarquia Lusitana, com uma parte de Geografia, e não portuguesa), apresentando algumas críticas e queixas ao marquês de Pombal, ao longo da sua descrição, sobre o que o mesmo autor escreveu, relativamente ao rio Guadiana.
Sobre o nome do rio Guadiana, explicou ser de origem mourisca, mas chamou-se Annas no tempo dos latinos (romanos), não escreveu que, este rio chamou-se "Odiana" desde a conquista destas terras pelos portugueses, até à perda da independência de Portugal, em 1580.
Parece que, o Pároco, estava bem informado sobre o lugar ou lugares da nascente do rio Guadiana, escreveu que, era nos Olhos do Guadiana, mas referiu, que tinha outra nascente a montante deste lugar e, neste caso, também citou outros autores, descreveu que o rio era subterrâneo umas seis ou sete léguas, e parece que, existe fundo de verdade, o rio ao passar por uma região de rochas porosas, estas permitem a infiltração das suas águas a montante dos ditos olhos do Guadiana, havendo um espaço geográfico que as águas desaparecem.
São mencionadas algumas Ribeiras e Ribeiros fora da Freguesia e até do Concelho de Monsaraz, mas também referiu as Ribeiras de Azevel e da Pêga, esta última, onde nasce e onde morre, e em relação à Ribeira do Azevel, apenas escreveu que entrava nesta Freguesia e ia separando os Concelhos de Monsaraz e de Terena até desaguar no rio Guadiana, junto ao Moinho do Gato, também se referu a algumas espécies de peixes que existiam nesta Ribeira.
Escreveu sobre os barcos e barcas que navegavam em todo o rio Guadiana no Reino de Portugal, logo, refere a barca que fazia a travessia do rio, entre os Concelhos de Mourão e de Monsaraz.
O Pároco escreveu que existia grande abundância de peixes no rio Guadiana, indicando as espécies e que, faziam pescarias livres todo o ano mas mais nos meses de Fevereiro, Março e Abril, era quando pescavam os grande peixes.
Quanto aos Moinhos e assudes no rio Guadiana o Pároco escreveu que, estava tão povoado que, seria impossível haver lugar para mais algum, mas não referiu os seus nomes. mas descreveu bem o que era um Moinho de Rodete, os do rio Guadiana que, as mós ao rodarem com muita velocidade, podiam queimar a farinha se o moleiro não estivesse a controlar a quantidade de trigo a entrar nas mesmas, enquanto isso, não acontecia com o Moinho de Rodizios, e era isso, que o Brito não levou em conta, nas suas criticas à farinha dos moinhos do rio Guadiana.
Sobre as localidades onde o rio Guadiana passava ou banhava, deu uma boa informação, indicando as do Reino de Castela e as do Reino de Portugal, neste caso, de Elvas até Alcoutim, cometendo aqui um erro, depois de Alcoutim era Mértola.
O Pároco Manuel Gomes Cunqueiro Velho, fez uma boa descrição do celebrado rio Guadiana, por vezes exagerada, mas deixou-nos um bom retrato do mesmo e dos seus afluentes, como eram em 1758, neste caso, naquela Freguesia e na região da Vila de Monsaraz.
Fim
Correia Manuel

Igreja de São Tiago de Monsaraz



Aldeia de Vila Real - Juromenha - 1758

História e estórias do celebrado rio Guadiana e de seus afluentes 10 - Aldeia de Vila Real - Juromenha - 1758 A descrição do celebrado rio G...