domingo, 11 de fevereiro de 2024

Memórias da importância dos poços de água, em Capelins

Memórias da importância dos poços de água, em Capelins 

Conforme podemos verificar no que conhecemos da história de Capelins, quanto às estruturas sociais de apoio aos povoadores, em tempos remotos não existiam poços de água nesta região, talvez apenas uma ou duas "noras", parece que, da época da ocupação dos árabes, porque, as Fontes de água com bons nascentes, com poucos metros de profundidade, jorravam água todo o ano que, abasteciam a população, quanto à água para os gados, havia chaboucos e pedreiras e, alguns bebiam nas Ribeiras e no Rio Guadiana.

Nos Registos Paroquiais, dos nascimentos, casamentos e óbitos, verifica-se que, na centúria de 1600, a Freguesia de Santo António de Terena, era assim que se chamava, atingiu um grande número de moradores, talvez mais de mil, depois, devido às várias guerras com os vizinhos castelhanos, principalmente a da Restauração, 1640-1668, esta Freguesia ficou quase despovoada até aos finais da centúria de 1600, começando a recuperar após a venda das herdades da Freguesia a particulares e da chegada da Casa do Infantado em 1698, no entanto, nessa época, não havia necessidade de mais água. 

A partir do início da centúria de 1900, pensamos que, não só, pelo aumento da população, que atingiu o auge na década de 1950, mas também pela mudança climática, com os sucessivos anos de seca os níveis freáticos baixaram e, os nascentes das Fontes começaram a diminuir, sendo necessário a abertura de poços que fossem ao encontro da água, cada vez a maiores profundidades, alguns nasceram de pedreiras, lugares onde era arrancada pedra de xisto para construção e à medida que as aprofundavam para arrancar pedra, começava a surgir água, mais tarde, algumas foram transformadas em poços, os quais, geralmente tinham de cinco até dez metros de profundidade, com excepção de alguns, como o poço da bomba, da Junta de Freguesia de Capelins que, foi levado a uma profundidade de cerca de vinte metros e com duas galerias laterais. 

A maioria dos poços de água eram construídos em lugares previamente escolhidos por vedores, os quais, com uma vara de oliveira ou de metal encontravam as chamadas veias de água e marcavam o lugar do poço que era aberto cavando manualmente até à profundidade que garantisse muita água, depois era empedrado, começavam a fazer uma parede em redondo a partir do fundo, pondo pedra de xisto sobre pedra, sem cal, barro ou cimento para não poluir a água e subiam a dita parede até ao gargalo, ou seja, a parede subia até pelo menos um metro acima do nível do solo e nesse redondel à superfície levava uma pedra de xisto da mesma altura do gargalo bem encaixada no mesmo e que permitia aos utilizadores chegar à frente para tirar a água do poço.

Os poços de água no perímetro da Aldeia de Ferreira, surgiram por necessidade de abastecimento de água à população, aos animais e para rega de hortas e arvoredo e durante a referida centúria surgiram mais de quarenta poços, além de algumas pedreiras e chaboucos que forneciam água para lavar a roupa das famílias, para dar de beber aos animais e para rega. 

A maioria das Fontes de água que existiam na proximidade da Aldeia, acabaram por desaparecer, talvez porque, os poços eram tantos em seu redor que lhe tiraram a pouca água que ainda tinham até ao princípio do verão, num vale do Gomes existiam quase em linha oito poços, e desde o Monte da Cruz junto ao Ribeiro do poço do chorão e da Aldeia, até ao poço da estrada, cerca de quinze poços.

Como diziam os nossos ancestrais: - "A água não se negava a ninguém", fosse um copo, um cântaro ou um balde, então, os donos dos poços na Aldeia de Ferreira, quase todos, de boa vontade, deixavam os vizinhos abastecer a sua casa de água a partir dos seus poços, pelo que, de manhã cedo ou à tardinha, depois de um dia de trabalho no campo, assistia-se ao corrupio de mulheres a correr aos poços encher dois cântaros de barro, levavam um à cabeça em cima de uma rodilha e outro debaixo de um braço e um balde cheio de água na outra mão, em passo largo, quanto mais perto de casa fosse o poço, melhor seria, porque ao chegar a casa tinham de fazer a ceia (jantar) para toda a família, fora das épocas sazonais do trabalho, continuavam a ir ao poço, mas com mais vagar, podiam dar umas lérias e trocar as novidades entre elas, junto ao mesmo. 

Alguns destes poços, como o poço do chorão, eram lugares estratégicos para encontros de namorados, era junto deles que, à pressa, porque as mães das raparigas controlavam o tempo, que se viam, falavam e se pudessem, davam uns beijos e, no caminho entre as casas e os poços, os rapazes que pretendiam uma rapariga saíam-lhe ao caminho e diziam-lhe que estavam interessados nela e assim surgiram alguns namoros que deram em casamento.

Na Aldeia de Ferreira, até ao ano de 1958, quando a Junta de Freguesia mandou abrir o poço da bomba, foi o poço do chorão o maior fornecedor de água à população, embora fosse mais à de Capelins de Baixo, enquanto a de Capelins de Cima recorresse mais aos poços, da ti Maria Russa, da ti Gertrudes "Alha", do ti José "Anão" e do ti Manuel "Rato" ou do telheiro, assim designado por ter um forno de cozer tijolos e telhas a poucos metros, e outros poços. 

A partir do ano de 1974, com a chegada da água canalizada à Freguesia de Capelins, os poços de água começaram a perder a sua importância e, a maioria, atualmente estão abandonados. 

Fim 

Texto: Correia Manuel 

Poço do Chorão - Aldeia de Ferreira 




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